30.1.04

Os mineiros da verdade, os incorruptos e os palermas

Temos, assim, um grupo de pessoas que se atribuiu uma missão, nobre; e que por causa dessa missão escolheu a profissão que melhor lhe permite, a seus olhos, defendê-la. O tempo passa e essas pessoas têm que justificar as suas escolhas, têm que mostrar que a missão e o ânimo originais estão intactos.

Temos tudo? Não. Essas pessoas não vieram de Marte - vieram da mesma espécie que produziu, por exemplo, os funcionários das bombas de gasolina, a Naomi Klein, os advogados e as meninas da caixa dos supermercados. Poderíamos ver de que subgrupo ou classe social provêm, mas isso não é, por agora, relevante.

"Era tão giro, aquela altura. Estávamos sempre a fazer cair ministros": isto não me foi dito por um empregado da limpeza dos ministérios, mas por uma jornalista (à época, e isto não passa de uma simples coincidência, funcionária do jornal "Público"). É legítimo supôr que se os jornalistas têm certas coisas que os diferenciam do resto da população, tal como os skippers de barcos à vela, os empregados ferroviários ou as top models, com ele partilham outras; e uma dessas coisas, suponho eu, é que a percentagem de palermas que trabalha, por exemplo, na apanha de tomates (e que eu penso, sinceramente, ser uma minoria) não deve ser muito diferente da percentagem de palermas que se encontra nas redacções dos jornais ou nos estúdios das televisões e rádios (estão, claro, igualmente em minoria, mas isso tão-pouco é relevante por agora).

O que interessa é que qualquer palerma pode, se quiser, comprar uma caixa de tomates e atirá-los à cara daqueles que o governam e de quem não gosta. Faz um certo dano, mas relativamente limitado e fácil de corrigir; sabe, sobretudo, que o que está a fazer é um delito e, como tal, punível.

O mesmo não se passa, infelizmente, com algumas das pessoas que escolheram o jornalismo como profissão: o dano que elas fazem não é limitado; fazem-no em nome de uma causa que os dispensa de seguir as regras estabelecidas; e fazem-no sobretudo, porque é a "missão" deles.

E assim temos, inevitavelmente, senhores Gilligan, e pessoas inteligentes a escrever que estão imunes a laços familiares, a relações afectivas próximas, etc.

É claro que também temos inúmeros jornalistas que sabem distinguir entre a sua opinião e os factos que relatam; que sabem que a missão deles é simples e comezinha, não transcendente nem sobre-humana; que sabem que as regras e leis se lhes aplicam também a eles, porque nada, nem ninguém está isento de as seguir - mas esses não são, infelizmente, representativos, nem maioritários.

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