De regresso a casa. Um pesadelo que começou no dia 4 de Julho em Salvador da Bahia chega ao fim - ou melhor, começa a deixar entrever o seu fim.
A cena chave da estadia no hospital será para sempre, creio, a do senhor que dizia: "sou do Porto, do Futebol Clube do Porto e amigo pessoal do Pinto da Costa" que, no dia em que vai ser operado e já vestido para isso, chama Bimba a uma enfermeira, porque ela vem de Bragança e fala com um chotaque carregadíchimo - e em seguida se põe à frente do espelho a pentear-se com meneios de galã italiano ds anos 60. Isto vestido com: uma bata aberta atrás, nada por baixo e meias brancas apertadíssimas até meio das coxas. Para completar a personagem: em cada duas palavras que dizia, uma era um "portismo", estivesse onde estivesse.
E, noutro registo, um diálogo instrutivo com a enfermeira-chefe, a quem digo que há ali dois ou três enfermeiros muito bons, e me responde "são todos bons". Quando lhe digo que sim (é verdade, o nivel era francamente positivo - o leque ia do muito bom ao medíocre, não chegava sequer ao mau), mas que alguns são melhores do que os outros, insiste: "São todos igualmente bons". Até quando, este medo do mérito?
Enquanto lá estive, deu-me para compilar listas de 5 (as 5 maiores dores, 5 vezes que estive perto da morte, etc.) - felizmente não tomei nota de nenhuma. E agora passou a vontade.
É bom estar em casa, ouvir Rachmaninov, Gould, Cohen ("Your pain is no credential"), Jeanne Lee, regar as plantas, passear por Cascais (andar é sempre bom, mesmo que se ande devagar) - e pensar que a cumplicidade com o safado deste corpo está para durar.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.