Sim, eu sei. Há muito que quero escrever sobre aquela árvore no jardim de minha casa em Lubumbashi, mas não sei por onde começar. As plantas, a relva, as árvores cresciam a olhos vistos, literalmente. "Não é de estranhar", dizias-me: "esta alternância de calor abrasador e chuva copiosa faria crescer um tronco seco". No meio do jardim havia uma árvore enorme, à sombra de cujos ramos nos sentávamos ao fim da tarde - e por vezes, se era domingo e não havia nenhum empregado em casa, nos amávamos.
Muito desejava eu ter uma chuva assim, e um calor, para fazer renascer o meu amor por ti. Mas não tinha, não tinha. E eu não sabia como dizer-te que já não te amava - mesmo o "já" era uma mentira generosa, nunca te tinha amado: tinha-te desejado, aos teus olhos grandes e ávidos e inseguros, tinha-te querido à noite, todas as noites naquele quarto cujo ar condicionado não funcionava e em que os nossos suores se misturavam como as nossas memórias, e os nossos desejos, e os nossos medos, debaixo da árvore, quando tomávamos tu um chá e eu um whisky com muito gelo, e muita sede.
Não sabia como dizer-te, porque não te queria magoar, e um dia fiquei doente, lembras-te? uma crise de paludismo negligenciado deixou-me de rastos. Tu trataste-me, deste-me de beber, secaste-me o suor e fazias-me tomar os comprimidos. O paludismo é uma doença horrorosa, que te faz transpirar incontrolavelmente, e falar como transpiras, aos jorros, a tremer e a arder numa febre que te queima o corpo todo, nem os olhos consegues abrir, parece que o mundo se resume a um gigantesco incêndio e tu nada mais és do que uma chama nesse incêndio.
Quando emergi da febre descobri que sabias, vi-te na cara, nos lábios fechados a tristeza, a resignação. Deve ter sido a separação mais difícil da minha vida, tu esperaste até teres a certeza que eu estava bem, e só depois pegaste no teu saco e voltaste para tua casa.
Não tinha trabalho, fora desterrado para Lubumbashi para não me ouvirem. Passava os dias a andar pelas ruas largas, cobertas de árvores e de flores, esburacadas, poeirentas e lindas da cidade, e à tarde voltava para o meu jardim, beber whisky e olhar para as plantas. Nunca liguei à flora, foste tu que me ensinaste o nome de todas, eram dezenas e dezenas de espécies diferentes.
Fui nesses dias que me apercebi que era estranho, a árvore crescia ao contrário, para baixo - havia uma parasita que lhe pendia dos ramos mais baixos, nunca me tinha apercebido que as folhas não eram iguais às outras, e se aproximava do solo, quase trinta centímetros desde a minha chegada, dois ou três meses antes. E também só depois da tua partida comecei a amar-te, mas fui evacuado logo a seguir e nunca mais te vi.
Muito desejava eu ter uma chuva assim, e um calor, para fazer renascer o meu amor por ti. Mas não tinha, não tinha. E eu não sabia como dizer-te que já não te amava - mesmo o "já" era uma mentira generosa, nunca te tinha amado: tinha-te desejado, aos teus olhos grandes e ávidos e inseguros, tinha-te querido à noite, todas as noites naquele quarto cujo ar condicionado não funcionava e em que os nossos suores se misturavam como as nossas memórias, e os nossos desejos, e os nossos medos, debaixo da árvore, quando tomávamos tu um chá e eu um whisky com muito gelo, e muita sede.
Não sabia como dizer-te, porque não te queria magoar, e um dia fiquei doente, lembras-te? uma crise de paludismo negligenciado deixou-me de rastos. Tu trataste-me, deste-me de beber, secaste-me o suor e fazias-me tomar os comprimidos. O paludismo é uma doença horrorosa, que te faz transpirar incontrolavelmente, e falar como transpiras, aos jorros, a tremer e a arder numa febre que te queima o corpo todo, nem os olhos consegues abrir, parece que o mundo se resume a um gigantesco incêndio e tu nada mais és do que uma chama nesse incêndio.
Quando emergi da febre descobri que sabias, vi-te na cara, nos lábios fechados a tristeza, a resignação. Deve ter sido a separação mais difícil da minha vida, tu esperaste até teres a certeza que eu estava bem, e só depois pegaste no teu saco e voltaste para tua casa.
Não tinha trabalho, fora desterrado para Lubumbashi para não me ouvirem. Passava os dias a andar pelas ruas largas, cobertas de árvores e de flores, esburacadas, poeirentas e lindas da cidade, e à tarde voltava para o meu jardim, beber whisky e olhar para as plantas. Nunca liguei à flora, foste tu que me ensinaste o nome de todas, eram dezenas e dezenas de espécies diferentes.
Fui nesses dias que me apercebi que era estranho, a árvore crescia ao contrário, para baixo - havia uma parasita que lhe pendia dos ramos mais baixos, nunca me tinha apercebido que as folhas não eram iguais às outras, e se aproximava do solo, quase trinta centímetros desde a minha chegada, dois ou três meses antes. E também só depois da tua partida comecei a amar-te, mas fui evacuado logo a seguir e nunca mais te vi.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.