24.9.08

A mulher, os braços

Vi-a pela primeira vez num restaurante nepalês, fracote, da rua de S. José. Estava sentada à mesa, era pequenina, morena, muito bonita e tinha oito braços, com os quais comia um Tikka Masala sofrível, folheava um livro e - mais tarde, muito mais tarde - me acariciava.

Tinha uma vagina só, pelo que não foi muito difícil fazer-lhe amor. Difícil foi libertar-me - cada braço era, apercebi-me depois, comandado por um cérebro diferente e foi preciso convencê-los a todos, com argumentos que fizessem face àquele exército de mentes potentes e membros poderosos. Cada um deles procurava uma coisa diferente e, pior ainda, temia outra: era preciso encontrar um argumento que não fizesse medo a nenhum e os convencesse a todos.

Foi há muito tempo. Não me lembro do que lhes disse. Não sei sequer se me libertou: por vezes parece-me sentir a leve carícia de um daqueles tentáculos, ligeira e reptícia, sensual como o tempo que passa, como a luz de um fim de tarde depois da chuva, como as vagas que, nas manhãs sem vento, se desfazem na areia e nem um grão tiram do sítio.

1 comentário:

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.