8.10.08

Barcelona

Fui ao cinema ver “O mistério de Galíndez”, um thriller simpático baseado num livro do Vazquez Montalban qui li há uns tempos. Depois resolvi andar um pouco a pé e vim por aí abaixo, a pensar que a avenida que vinha a descer se parecia bastante com a Avenida da Liberdade. Aliás, por curiosidade, até desemboca numa praça que é o Rossio cá do sítio. Chama-se Plaza Catalunya, ou qualquer coisa assim, e a coincidência é tal que ao lado até há uma outra praça que podia fazer as vezes da praça da Figueira, e a que eles chamam Orquinaona. É verdade que a Catalunya é muito maior que o Rossio, e a avenida que eu vinha a descer é maior que a Avenida da Liberdade, mas é sempre bom termos assim uns pontos de referência quando estamos a viajar. Se não parece que estamos perdidos. Ainda andei a ver se encontrava o equivalente da Avenida de Roma ou do Largo da Estrela, ou mesmo do Princípe Real, mas não encontrei.

Depois ocorreu-me que Barcelona é, decerto, a primeira cidade da Catalunha, mas é a segunda de Espanha, e isso aproxima-a muito mais do Porto. Aliás, até têm aqui uma coisa que faz lembrar a Torre dos Clérigos, e que se chama Sagrada Familia. Ao nível das ruas é mais difícil ver as parecenças com o Porto – excepto talvez a Diagonal, que é a Boavista sem tirar nem pôr. Há muitas outras parecenças com o Porto: aqui, por exemplo, eles também insistem em falar com um sotaque que mais ninguém entende e têm muito orgulho nisso. Mas não é só ao nível dos monumentos ou do sotaque que isto faz lembrar o Porto: Barcelona também tem um arquitecto muito conhecido lá fora, ou mesmo dois; e as ruas da cidade velha, onde tenho andado a passear, também cheiram a mijo. Mas é difícil fazer muitas comparações com o Porto, primeiro porque isto é muito maior e depois porque não conheço bem nem o Porto nem Barcelona.

Nas minhas andanças fui ter a um bar africano. Nisto é muito diferente, primeiro porque no Porto os pretos são cabo-verdianos e falam português, e aqui eles falam espanhol, pelo menos comigo (talvez falem outra língua quando estão sozinhos). E são muito mais pretos do que os nossos.

Gosto imenso de Barcelona. Ontem tive uma reunião com uns gajos muito ricos (pai e filho, ou se calhar filho e neto, ou mesmo mais, bisneto, de ricos). Não vi foi embaixadores, ministros, diplomatas ou aspirantes a cargos internacionais. Confesso que gostava, porque já estou a ficar farto dos ricos. Aposto que políticos e diplomatas e ministros é outra loisa.

O meu quarto de hotel é ligeiramente maior do que o guarda-fatos - o que para já demonstra que tem um guarda-fatos, prodígio sem paralelo do arquitecto que desenhou aquilo. Também tem um duche, e quando eu tiver menos vinte quilos conseguirei entrar nele sem ter que fazer exercicios de stretching; tem mesmo um lavatório, uma mesinha de cabeceira, uma cama, janela com uma escola dos salesianos por baixo: tem tudo o que os outros quartos têm, só que em mais pequeno. O preço também: 23 euros por noite, quem diz melhor? E hoje consegui mesmo andar, depois de acordar: prova que as minhas costas exageram, como de costume, os seus gritos de dor.

As fotografias do café são bonitas, mas a música é medíocre, e a vizinha está a ir-se embora. Tem pelos nas costas: que se vaya, como eles aqui diriam se não falassem aquele dialecto esquisito deles...

Barcelona, 2003

2 comentários:

  1. Também gosto de estabelecer paralelos entre as cidades que mal conheço e as que conheço melhor, Luís. Estranhamento, uso-os, sobretudo, para encurtar distâncias, no pressuposto de que a familiaridade torna os percursos mais rápidos. Acho giríssimos os pontos de afinidade que encontra entre Barcelona e o Porto. Eu só consegui estabelecer alguns com Lisboa, mas a minha visão é muito pobre em recursos e imaginação. :-)

    ResponderEliminar
  2. Na realidade, Luísa, descobrir o provincianismo de Barcelona foi uma verdadeira surpresa. Já lá estivera várias vezes, antes desta, e nunca me apercebera realmente do que a cidade é na realidade (enfim, pelo menos na minha realidade); donde esta ligeira brincadeira com o Porto, uma cidade que também exporta arquitectos e tem uma torre.

    Há contudo coisas em Barcelona de que não gosto realmente - e a xenofobia é uma delas. Não me posso queixar, pessoalmente - antes bem pelo contrário: já tive situações em Barcelona que me deixaram comovido às lágrimas por ser português. Mas a Catalunha é xenófoba, isso parece-me indiscutível.

    Ao contrário, essa sua afirmação de que a sua "visão é muito pobre em recursos e imaginação" parece-me muito, mas mesmo muito, discutível.

    ResponderEliminar

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.