10.5.09

Firmes são as verticais do desejo

Firmes, tão firmes são as verticais. As horizontais são mais indistintas, menos claras. Às vezes é o contrário, claro: horizontais firmes como as rochas do Cabo da Roca e verticais tíbias. Ou então não há fimezas em lado nenhum: nem nas horizontais nem nas outras, que agora são tão verdes e tão direitas, amarelas e sensuais.

"Nunca se deve oferecer jarros a uma senhora que não se conhece bem", dizia-me já não sei quem. Nunca os ofereci - mas ofereci-me eu a eles. Tantas vezes: tão direitos, tão firmes, tão sólidos. E agora recebo-os: se fosse uma senhora teceria um comentário inteligente sobre as formas horizontais um pouco difusas; falaria do tempo que levaram a crescer, do hirto que eles são; mas não falaria das verticais, essas verticais do desejo que sabem que o essencial não se vê, e só raramente se deixa fotografar.

O essencial está nas horizontais. De tão deitadas me fazem pensar em ti, quando nos amámos pela primeira e última vez. O teu sorriso era aquele: amplo, difuso, belo, quase monocromático - porque a felicidade o é - tão leve, alegre.

Só depois de te amar te vi. Eras a porta que todos sonhamos na Índia, ou numa daquelas possessões que perduraram até hoje. Eras a porta e a folha o verde da água e da árvore, numa só: eras tu, "inesgotável e pura", reflexo de um desejo límpido num outro desejo límpido, defendido por uma porta impugnável, e escancarada.

3 comentários:

  1. A linha horizontal (ou linha do horizonte), apesar de corresponder ao ponto imaginário principal é, desde que se olhe através da tela para o espaço aberto, o horizonte real...
    (3.ª regra matemática de Durer)

    :-)

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  2. Luís, tenho a dar-lhe a revoltante notícia de que, percorrendo há uns dias a Avenida da Liberdade, dei por que já não havia jarros (com uma ou duas excepções muito murchas). Para além das verticalidades e horizontalidades aqui tão graciosamente desenvolvidas, gosto imenso de jarros, como gosto, em geral, das flores de traços e cores simples.
    Obrigada pelas referências. :-)

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  3. Os jarros foram as "minhas" primeiras flores: eram a flor favorita da minha Mãe, e tínhamos permanentemente a casa cheia deles. Depois, com a ida para Moçambique, desapareceram, substituídos por espécies mais exóticas (ou por outra razão qualquer, não sei).

    Desabituei-me de os oferecer, salvo a pessos que conheço bem. São, estou de acordo consigo, flores simples, magníficas.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.