16.3.10

Redifusão

Às vezes apetece-me repescar posts antigos. Aqui vai um, de 13 de Março de 2004, ligeiramente editado:

"Chove a rodos. São as primeiras chuvas. Esperemos que desta vez não haja inundações. No Burundi, quando chovia, podia ver-se o capim a crescer. Enfim, quase: saía-se de casa de manhã e à tarde quando voltávamos a erva tinha crescido uns bons centímetros. Era mágico.

Eu continuo à espera da chuva, a outra, que faz crescer o negócio e prosperar quem nele trabalha. A situação é grave. Enfim, desculpem-me chatear-vos com estas histórias e com a chuva metafórica que se faz esperar. Às vezes a vontade de dizer o que me vai no coração é grande, enquanto oiço os Madrigais do Monteverdi e a chuva não-metafórica continua a cair.

Não serve de nada ir trabalhar: está um tempo para ficar em casa com um bom livro e uma má companhia, e enchermo-nos de cultura, de whisky e de seios.

A chuva cai; violenta, cinzenta, aborrecida, chuva. Em breve as ruas estarão inundadas. A Câmara Municipal  refê-las, recentemente, mas utilizou um cascalho demasiado grande, que entope os escoamentos. É preciso dizer que há vinte e cinco anos que as ruas se enchem de água a cada chuvada - mas dantes eram necessárias três ou quatro horas de chuva, e agora uma chega. Ninguém consegue parar o progresso.


A chuva abrandou. Os Madrigais são esplêndidos. Oiço agora um cujo título é apropriado: "Omni amante é guerrier". Lamento não perceber o texto: o título faz crescer água na boca.


"C'était du sang, c'était
ce que tu as répandu, Seigneur.


Ca brillait."


" Nos yeux et notre bouche sont si vides, Seigneur.
Nous avons bu, Seigneur,
Le sang et l'image qui était dans le sang, Seigneur."

Termino com Celan, chave de ouro para um sábado lamuriento e pluvioso.



Maputo, 1999"

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.