Que faz à janela uma mulher tão feia? É loira, ri muito; fala ao telefone. Queria perguntar-lhe onde jantar, mas ela fala muito e ri-se, grata (isto sou eu a inventar. Não sei se está reconhecida por alguém lhe telefonar; não a ouvi sequer falar). Jantar é complicado. Todos os dias. Encontrar a mistura certa de pessoas que se querem ver, escolher um empregado que fale ou que não fale, um sítio que se conhece ou ir à aventura, sabendo que as probabilidades de sair desiludido estão a nove contra um. Mas que diabo. E com Lisboa cheia de turistas e de mulheres feias (as bonitas combinaram e foram todas de férias?) escolher um restaurante é uma tarefa sisífica. "As coisas são como são e não como deviam ser". Dizes-me isso todos os dias para te vingares do que te digo todos os dias também, vinte vezes entre o nascer e o pôr do sol, e metade disso entre o pôr do sol e o momento em que, de olhos fechados, já não ouves o que te digo. "Amo-te", e trinta por uma linha.
Digo-to todos os dias e hoje queria dizer-to de novo, mas o telefone impediu-me. Insurgiu-se, revoltou-se e disse-me "está calado e cala-te". Obedeci-lhe, claro: nunca se deve desobedecer a um telefone - pergunta à loira feia e grata da janela.
Os homens deviam, pelo menos uma vez por semana, abordar uma desconhecida (na rua, à janela, na bicha do supermercado ou no dentista; pouco importa onde) e tentar seduzi-la. Desde que, obviamente, tenham as probabilidades todas contra eles: nada como uma boa tampa para perspectivar correctamente a tristeza. (Se as tiverem a favor não conta: contribui erradamente para a auto-estima). E se a tampa não vier, lutar por ela (pela tampa, não pela desconhecida): levá-la a um restaurante que não conhecem, do qual nunca ouviram falar; falar ao telefone durante o jantar; contar anedotas sem piada.
É preciso lutar por um fracasso; são esses os únicos que valem a pena. Fracassos que nos caem do céu não merecem respeito.
Digo-to todos os dias e hoje queria dizer-to de novo, mas o telefone impediu-me. Insurgiu-se, revoltou-se e disse-me "está calado e cala-te". Obedeci-lhe, claro: nunca se deve desobedecer a um telefone - pergunta à loira feia e grata da janela.
Os homens deviam, pelo menos uma vez por semana, abordar uma desconhecida (na rua, à janela, na bicha do supermercado ou no dentista; pouco importa onde) e tentar seduzi-la. Desde que, obviamente, tenham as probabilidades todas contra eles: nada como uma boa tampa para perspectivar correctamente a tristeza. (Se as tiverem a favor não conta: contribui erradamente para a auto-estima). E se a tampa não vier, lutar por ela (pela tampa, não pela desconhecida): levá-la a um restaurante que não conhecem, do qual nunca ouviram falar; falar ao telefone durante o jantar; contar anedotas sem piada.
É preciso lutar por um fracasso; são esses os únicos que valem a pena. Fracassos que nos caem do céu não merecem respeito.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.