1.1.12

Diário de bordos - 010112

O ano novo passou por mim a dormir. O velho já lá vai, como tantas coisas. Portugal, por exemplo. Parece-me cada vez mais distante. As notícias, os posts, os comentários que leio referem-se a um país que pouco a pouco se afasta de mim, um país que me parece cada vez mais estranho, nos dois sentidos do termo.

"On n'est pas d'ici, demain on s'en va", diz uma das minhas frases favoritas (é do pai de Marguerite Yourcenar, relatado por ela em Souvenirs Pieux, se não me engano). Não é a primeira vez que tenho esta sensação de que não sou eu que me afasto, é o país que sai de mim, se extrai até dele pouco ficar.

Talvez o que fica em nós depois de tudo o resto sair seja o mais importante, o que nos define. Não sei. Sei que hoje chega a metade boa de mim; que em breve estaremos de saída não importa para onde; e que, cada vez mais, o meu país é aquele onde vivo cada dia, não aquele onde nasci ou os que deixei.

Todas trazemos em nós um bocadinho de onde somos; mas é um bocadinho de um jardim, uma parte pequena da nossa terra: o resto fazemo-lo nós. "A pátria é um acampamento no deserto", diz um provérbio árabe citado por Cioran. Talvez seja uma sucessão de acampamentos no deserto: a pátria é a vida que vivemos, os lugares onde vivemos, mais aquela porção do tempo que fomos sedimentando (porque a maior parte do tempo esvai-se, desaparece, deixa de existir. Só uma pequena parte dele se mantém em nós, e nós nela).

Não conheço Antigua, já por aqui o disse: vivo numa bolha chamada Falmouth Harbour. Os meus amigos são tão italianos, ingleses, franceses, irlandeses como antiguanos (aconselho que se pronuncie antiganos, como o nome do país se pronuncia antiga). É um bom acampamento, num bom deserto.

Em breve haverá outros. Ainda bem.

1 comentário:

  1. O Excitações mexeu um bocadinho. Começou a soprar uma ligeira brisa...beijos, Maria

    ResponderEliminar

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.