16.2.12

O que as palavras designam

Foi assim que tudo aconteceu: eu pedi uma caipirinha. Depois outra, e outra, até que deixei de ser capaz de dizer caipirinha. Isto é, em vez de dizer "uma caipirinha, por favor" (dizer "mais uma" é para adolescentes, quem não percebe nada disto ou totós armados ao pingarelho) e comecei a dizer "uma, por favor". A rapariga do bar servia-mas sem hesitar, até que deixei de ser capaz de dizer "por favor" e dizia só "uma". "Uma quê?" perguntou-me a certa altura. "Felação", respondi. 

Pensava que ela não saberia o que felação quer dizer, mas ela sabia. Estava num "bar cultural". Respondeu-me "velho do caralho" e eu "nova da cona" (não sei o que é melhor, sinceramente).

Ela chamou um preto enorme que estava à porta mas eu aprendi a dar uns pontapés quando era puto e de repente estava com algemas num carro da polícia. O preto estava furioso, é preciso dizer as coisas como elas são.

Foi uma porra.

A miúda era gira, usava um boné à estivador de Londres e era magrinha e ainda a vi de raspão quando a carrinha da polícia se afastava comigo lá dentro.

Este é o problema dos centros culturais da província: com a internet e a televisão as gajas aprendem muitas palavras novas; e como não sabem dão-lhes valores esquisitos. Se eu tivesse dito "um broche" ela teria compreendido. O problema são as palavras, não o que elas designam.

1 comentário:

  1. Fartei-me de rir. Está a ver porque gosto de vir aqui? Eis uma das razões, além de escrever bem tem piada e já não devia estar com as caipirinhas todas nesta altura.
    Bom dia!

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.