Não sou escritor, ainda bem; seria uma chatice sem fim ter que escrever para viver, inventar palavras, emoções, fingir que se sente isso tudo e mais aquilo, aparecer nos jornais, preocupar-se com as críticas, ir aos cafés literários e aos desfiles de moda, falar com e para a "cena cultural", ter ideias, imaginar coisas, escrever. Nada disso. Escrevo porque me apetece, porque os teus seios são bonitos e estão longe, ou estão perto, porque te amo e te quero amar ainda mais, porque me esqueço disso tudo, porque sim.
Escrevo porque gosto de onde estou ou porque não gosto, para não gostar de onde estou, escrevo porque onde estou me indifere completamente, porque quero estar no mar e não estou; escrevo para te dizer que te amo, porque beber faz mal ao fígado, porque tenho mau feitio e gosto dele, do feitio; escrevo porque quero, me apetece, me gusta, me gustas, tu e tu e tu, só tu.
Preciso de cortar o cabelo, de emagrecer, de me ir embora, de ti, de ir ao cinema, de ir ao teatro, de ir navegar, de fazer um viagem grande, dois meses no mar, três sem parar, vamos para as ilhas do Pacífico? Para o Mediterrâneo, essa merda de caldeirão? Para o Índico (hoje li que Sri Lanka vai fazer a primeira marina do oceano Índico, vê lá tu, qualquer dia até na Antártica há marinas e parques de estacionamento para pinguins). Podemos ir para onde quisermos, o mundo é nosso, basta que tenha mar e vento, o resto levamos nós - tu o sol eu as vagas, tu as palavras eu as vírgulas, tu o futuro eu o nada.
Em São Luís a água do mar é castanha, há muitos rios, a profundidade é pequena e o mar está cheio de areia e da lama que os rios trazem. Preciso de mar azul, transparente, turquesa, preciso de ti, marquesa, preciso de rimar mar com vida, o mar convida; e nós vamos para onde ele quiser. Que se foda o futuro, mulher, que se foda o destino, deixa-os a foder um com o outro, olha que par, o destino e o futuro. Je suis contre le destin, tout contre; et contre le temps. Je m'en fous du passé, du présent, de l'avenir. Fuck them all, SINE QUA NON ahoy, sine niente, ya ni parruski govario, talvez um dia possamos ir a Nakhodka para eu te ensinar a beber vodka como quem bebe aguinha; ou a diferença entre vodka e fodka, tão pequena.
Os meus cabelos caem como se achassem a minha cabeça indigna deles; já era tempo. Ainda se todas as barbeiras fossem como a Helga, ou Elsa, ou coisa que o valha, tão bonita que até eu de lá saí bonito; mas não são. Os meus cabelos são tão fracos que nem os piolhos lá querem estar.
Pouco me importam os piolhos. Prefiro a tua mão, as duas, as mamas que por vezes me esfregavas assim como se fosse por acaso enquanto eu apertava os sapatos e a cabeça ficava mesmo ao nível delas, lembras-te? Tu ainda nua, eu já vestido, sentado na cadeira do hall e tu ao meu lado, mamas na tola e eu a dizer-te "tenho de me ir embora" "pois tens" "então deixa-me ir" "vai" e eu mandava os sapatos para o raio que os partissem e voltava para a cama às vezes nem lá chegávamos era só desapertar a gravata e tirar o cinto e lá desaguavam os oceanos todos no tapete ou no sofá da sala ou onde calhasse. "Devíamos misturar os livros", dizias depois como se nada fosse contigo.
Nada nunca foi contigo até conheceres o mar, não é? Só agora percebes que o mar se está a marimbar no futuro e ainda mais no passado, o mar pega no tempo e dissolve-o, dá-lhe a volta, enrola-o como eu enrolava a mão nas tuas coxas e te olhava nos olhos para ver o resultado, não olhava para as coxas. O mar é assim pega em nós todos e olha para outro lado qualquer.
Era bom acariciar-te as coxas, repara, as virilhas, o polegar um bocadinho esticado para o meio, os olhos nos teus para ver se estava a ir bem.
É para te dizer estas coisas que escrevo, não para escrever. Escrever é uma seca, como um país sem mar, ou o mar sem vento. Já escrever-te é o contrário, é bom, posso falar-te da queda dos meus cabelos, parece que tenho uma catarata do Niagara seca na cabeça, dos piolhos que não tenho, das tuas coxas, do mundo todo onde elas vão passar e abrir-se para mim como o mar se abre para as proas dos navios.
"Il n'y a jamais assez de mer pour les visages aigus des bateaux" dizia le Clézio. "Il n'y a jamais assez de toi pour moi"; é menos bonito mas mais verdadeiro, não é? É. És. Um dia amar-nos-emos na primeira marina do Índico como nos amávamos no sofá da sala, porque o mar é nosso sofá, ou a nossa sala, como preferires, é-me igual, não percebo nada de metáforas nem de analogias, eufemismos, literatura, não percebo nada de nada se não de ti e do amor por ti.
São Luís cheira a mijo e seria uma cidade apaixonante, aposto que seria, se tivesse tempo e paciência para me apaixonar; não tenho. Nem quero ter, é isso o pior, não quero ter tempo para nada de que tu não faças parte. Porque sem ti não há tempo, não há nada, nem o vento parece vento nem o mar.
Escrever é ligeiramente menos egoísta do que amar e só tem uma vantagem sobre o amor: pode ser feito sem ti.
Escrevo porque gosto de onde estou ou porque não gosto, para não gostar de onde estou, escrevo porque onde estou me indifere completamente, porque quero estar no mar e não estou; escrevo para te dizer que te amo, porque beber faz mal ao fígado, porque tenho mau feitio e gosto dele, do feitio; escrevo porque quero, me apetece, me gusta, me gustas, tu e tu e tu, só tu.
Preciso de cortar o cabelo, de emagrecer, de me ir embora, de ti, de ir ao cinema, de ir ao teatro, de ir navegar, de fazer um viagem grande, dois meses no mar, três sem parar, vamos para as ilhas do Pacífico? Para o Mediterrâneo, essa merda de caldeirão? Para o Índico (hoje li que Sri Lanka vai fazer a primeira marina do oceano Índico, vê lá tu, qualquer dia até na Antártica há marinas e parques de estacionamento para pinguins). Podemos ir para onde quisermos, o mundo é nosso, basta que tenha mar e vento, o resto levamos nós - tu o sol eu as vagas, tu as palavras eu as vírgulas, tu o futuro eu o nada.
Em São Luís a água do mar é castanha, há muitos rios, a profundidade é pequena e o mar está cheio de areia e da lama que os rios trazem. Preciso de mar azul, transparente, turquesa, preciso de ti, marquesa, preciso de rimar mar com vida, o mar convida; e nós vamos para onde ele quiser. Que se foda o futuro, mulher, que se foda o destino, deixa-os a foder um com o outro, olha que par, o destino e o futuro. Je suis contre le destin, tout contre; et contre le temps. Je m'en fous du passé, du présent, de l'avenir. Fuck them all, SINE QUA NON ahoy, sine niente, ya ni parruski govario, talvez um dia possamos ir a Nakhodka para eu te ensinar a beber vodka como quem bebe aguinha; ou a diferença entre vodka e fodka, tão pequena.
Os meus cabelos caem como se achassem a minha cabeça indigna deles; já era tempo. Ainda se todas as barbeiras fossem como a Helga, ou Elsa, ou coisa que o valha, tão bonita que até eu de lá saí bonito; mas não são. Os meus cabelos são tão fracos que nem os piolhos lá querem estar.
Pouco me importam os piolhos. Prefiro a tua mão, as duas, as mamas que por vezes me esfregavas assim como se fosse por acaso enquanto eu apertava os sapatos e a cabeça ficava mesmo ao nível delas, lembras-te? Tu ainda nua, eu já vestido, sentado na cadeira do hall e tu ao meu lado, mamas na tola e eu a dizer-te "tenho de me ir embora" "pois tens" "então deixa-me ir" "vai" e eu mandava os sapatos para o raio que os partissem e voltava para a cama às vezes nem lá chegávamos era só desapertar a gravata e tirar o cinto e lá desaguavam os oceanos todos no tapete ou no sofá da sala ou onde calhasse. "Devíamos misturar os livros", dizias depois como se nada fosse contigo.
Nada nunca foi contigo até conheceres o mar, não é? Só agora percebes que o mar se está a marimbar no futuro e ainda mais no passado, o mar pega no tempo e dissolve-o, dá-lhe a volta, enrola-o como eu enrolava a mão nas tuas coxas e te olhava nos olhos para ver o resultado, não olhava para as coxas. O mar é assim pega em nós todos e olha para outro lado qualquer.
Era bom acariciar-te as coxas, repara, as virilhas, o polegar um bocadinho esticado para o meio, os olhos nos teus para ver se estava a ir bem.
É para te dizer estas coisas que escrevo, não para escrever. Escrever é uma seca, como um país sem mar, ou o mar sem vento. Já escrever-te é o contrário, é bom, posso falar-te da queda dos meus cabelos, parece que tenho uma catarata do Niagara seca na cabeça, dos piolhos que não tenho, das tuas coxas, do mundo todo onde elas vão passar e abrir-se para mim como o mar se abre para as proas dos navios.
"Il n'y a jamais assez de mer pour les visages aigus des bateaux" dizia le Clézio. "Il n'y a jamais assez de toi pour moi"; é menos bonito mas mais verdadeiro, não é? É. És. Um dia amar-nos-emos na primeira marina do Índico como nos amávamos no sofá da sala, porque o mar é nosso sofá, ou a nossa sala, como preferires, é-me igual, não percebo nada de metáforas nem de analogias, eufemismos, literatura, não percebo nada de nada se não de ti e do amor por ti.
São Luís cheira a mijo e seria uma cidade apaixonante, aposto que seria, se tivesse tempo e paciência para me apaixonar; não tenho. Nem quero ter, é isso o pior, não quero ter tempo para nada de que tu não faças parte. Porque sem ti não há tempo, não há nada, nem o vento parece vento nem o mar.
Escrever é ligeiramente menos egoísta do que amar e só tem uma vantagem sobre o amor: pode ser feito sem ti.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.