Fuengirola
Um gajo vai pelo cais de recepção da Marina de Fuengirola e a primeira coisa que vê é o café Ku-Damm (o menu inclui Goulasch e Sauerkraut). Ao lado, ou quase, há o Welcome Arms, e mais ou menos entre os dois o Schnitzel Haus. A caminho do duche ainda vê, não muito longe, o London Arms. Os turistas gostam, definitivamente, de se sentir em casa.
Em Gibraltar havia mais coisas escritas em espanhol do que aqui.
De resto, as surpresas são poucas e irrelevantes. A praga das pizzerie tem fraca expressão, por exemplo: uma só (na Marina. Aposto que a cidade está pejada delas). Os prédios são muito ligeiramente menos feios do que esperava; nem todos os bares têm televisão; há lugar na Marina em Agosto (tem havido "menos barcos este ano" em todo o lado, desde Portimão).
O dia de vela foi glorioso, o melhor em muito tempo: força 5 na alheta, sol, o S. a mostrar de novo o que tem no ventre; e é bastante. O barco é realmente espantoso de bom. Desembarcamos daqui a dias, mas lembrar-me-ei dele durante muito tempo.
Esta navegação diária (F. não gosta de navegar, muito menos à noite; faz esta viagem para não decepcionar o marido) é cansativa. Gostava de fazer dois ou três dias seguidos de mar. E se fossem semanas ainda melhor.
Uma caneca de cerveja diz-se um "tanque de cerveza". A exactidão tem uma beleza própria, que dispensa comentários.
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À chegada aos portos o calor tem sido infernal - perdão, celestial, já que tínhamos acordado, há tempos, a infernalidade do frio de Brighton. O calor aguenta-se melhor. Com mais duches e mangueiradas, menos roupa, mais copos de água fresca. À nossa frente no pontão está o O., um belíssimo Oyster 54 que era nosso vizinho em Brighton. Lembro-me do West Jetty nos dias de chuva e vento e sinto-me grata por estar a morrer de calor. Esta morte, ao contrário de outras, passará em Agosto (a menos, claro, que tenhamos a sorte de ir morrer longe, de preferência nas Caraíbas, já em Setembro ou Outubro).
F. adora os andaluzes e diz que se sente andaluz. Têm um sotaque fechado, como se falassem com a boca cheia de batatas, mas são simpáticos e atenciosos e estão sempre em festa. Vez por outra, há um de cara tão fechada como o sotaque, como a mulher que na praia de Barbate amaldiçoava o filho, um matulão de 11 anos, por alguma coisa que lhe fez. Gritou-lhe que se iria ver con su padre e, mais tarde, vimo-los passar de carro numa rotunda: o pai a conduzir, o filho ao lado e a mãe atrás a sovar o miúdo, todos numa gritaria aciganada. O quadro era tão dramático como a expressão enraivecida da mulher, mas a verdade é que nos desmanchámos a rir com aquela crise.
Há dez anos que não ia a Gibraltar. Não tendo nada a ver, fez-me lembrar St. Martin: a fúria duty free misturada com uma magnífica paisagem natural e um improvável aeroporto mesmo ao lado da marina. A Rocha é imponente e, tivesse havido tempo, tê-la-ia visitado com gosto. De resto, é surpreendente ter aquele bocadinho de Reino Unido em Espanha, em que os semáforos nos dizem "WAIT" e as bicicletas contam tanto como os automóveis.
Mas o importante foi a passagem. Pensar que há uma parte do mundo em que Europa e África, tão diferentes, quase se tocam é tão emocionante como atravessá-la. A bombordo uma tão próxima e familiar, e a estibordo a outra, mais longe e coberta de neblina, como um desejo que não se realizou. O Estreito, para quem tem destino marcado, é mais largo do que parece.
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Marina del Este
A marina é minúscula, mas muito bonita. "Há menos barcos este ano", diz-me de novo o marinheiro quando lhe pergunto se é normal haver lugar assim, sem reserva, em pleno mês de Agosto. Bem pode ser o refrão da viagem.
Qualquer dia chegamos. Temos tido sorte com os barcos - tanto o D. H. como S. são soberbos, cada um no seu estilo. Só espero que continue assim. E que as viagens sejam mais longas. Navegar oito horas por dia é, seja Deus louvado, infinitamente melhor do que trabalhar num escritório o mesmo número de horas; mas é pouco. Há muito mar por essa proa; ou, como escreveu le Clézio, "il n'y a jamais assez de mer pour les visages aigus des bateaux". Não conheço frase mais bonita, nem mais exacta para definir o que sinto cada vez que tenho de entrar num porto ao fim de tão pouco tempo no mar, e com tanto e tão bom vento para navegar.
(Post a duas mãos.)
Um gajo vai pelo cais de recepção da Marina de Fuengirola e a primeira coisa que vê é o café Ku-Damm (o menu inclui Goulasch e Sauerkraut). Ao lado, ou quase, há o Welcome Arms, e mais ou menos entre os dois o Schnitzel Haus. A caminho do duche ainda vê, não muito longe, o London Arms. Os turistas gostam, definitivamente, de se sentir em casa.
Em Gibraltar havia mais coisas escritas em espanhol do que aqui.
De resto, as surpresas são poucas e irrelevantes. A praga das pizzerie tem fraca expressão, por exemplo: uma só (na Marina. Aposto que a cidade está pejada delas). Os prédios são muito ligeiramente menos feios do que esperava; nem todos os bares têm televisão; há lugar na Marina em Agosto (tem havido "menos barcos este ano" em todo o lado, desde Portimão).
O dia de vela foi glorioso, o melhor em muito tempo: força 5 na alheta, sol, o S. a mostrar de novo o que tem no ventre; e é bastante. O barco é realmente espantoso de bom. Desembarcamos daqui a dias, mas lembrar-me-ei dele durante muito tempo.
Esta navegação diária (F. não gosta de navegar, muito menos à noite; faz esta viagem para não decepcionar o marido) é cansativa. Gostava de fazer dois ou três dias seguidos de mar. E se fossem semanas ainda melhor.
Uma caneca de cerveja diz-se um "tanque de cerveza". A exactidão tem uma beleza própria, que dispensa comentários.
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À chegada aos portos o calor tem sido infernal - perdão, celestial, já que tínhamos acordado, há tempos, a infernalidade do frio de Brighton. O calor aguenta-se melhor. Com mais duches e mangueiradas, menos roupa, mais copos de água fresca. À nossa frente no pontão está o O., um belíssimo Oyster 54 que era nosso vizinho em Brighton. Lembro-me do West Jetty nos dias de chuva e vento e sinto-me grata por estar a morrer de calor. Esta morte, ao contrário de outras, passará em Agosto (a menos, claro, que tenhamos a sorte de ir morrer longe, de preferência nas Caraíbas, já em Setembro ou Outubro).
F. adora os andaluzes e diz que se sente andaluz. Têm um sotaque fechado, como se falassem com a boca cheia de batatas, mas são simpáticos e atenciosos e estão sempre em festa. Vez por outra, há um de cara tão fechada como o sotaque, como a mulher que na praia de Barbate amaldiçoava o filho, um matulão de 11 anos, por alguma coisa que lhe fez. Gritou-lhe que se iria ver con su padre e, mais tarde, vimo-los passar de carro numa rotunda: o pai a conduzir, o filho ao lado e a mãe atrás a sovar o miúdo, todos numa gritaria aciganada. O quadro era tão dramático como a expressão enraivecida da mulher, mas a verdade é que nos desmanchámos a rir com aquela crise.
Há dez anos que não ia a Gibraltar. Não tendo nada a ver, fez-me lembrar St. Martin: a fúria duty free misturada com uma magnífica paisagem natural e um improvável aeroporto mesmo ao lado da marina. A Rocha é imponente e, tivesse havido tempo, tê-la-ia visitado com gosto. De resto, é surpreendente ter aquele bocadinho de Reino Unido em Espanha, em que os semáforos nos dizem "WAIT" e as bicicletas contam tanto como os automóveis.
Mas o importante foi a passagem. Pensar que há uma parte do mundo em que Europa e África, tão diferentes, quase se tocam é tão emocionante como atravessá-la. A bombordo uma tão próxima e familiar, e a estibordo a outra, mais longe e coberta de neblina, como um desejo que não se realizou. O Estreito, para quem tem destino marcado, é mais largo do que parece.
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Marina del Este
A marina é minúscula, mas muito bonita. "Há menos barcos este ano", diz-me de novo o marinheiro quando lhe pergunto se é normal haver lugar assim, sem reserva, em pleno mês de Agosto. Bem pode ser o refrão da viagem.
Qualquer dia chegamos. Temos tido sorte com os barcos - tanto o D. H. como S. são soberbos, cada um no seu estilo. Só espero que continue assim. E que as viagens sejam mais longas. Navegar oito horas por dia é, seja Deus louvado, infinitamente melhor do que trabalhar num escritório o mesmo número de horas; mas é pouco. Há muito mar por essa proa; ou, como escreveu le Clézio, "il n'y a jamais assez de mer pour les visages aigus des bateaux". Não conheço frase mais bonita, nem mais exacta para definir o que sinto cada vez que tenho de entrar num porto ao fim de tão pouco tempo no mar, e com tanto e tão bom vento para navegar.
(Post a duas mãos.)
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.