As coisas não deviam esbarrar no vazio. Comecemos por definir coisas, e depois vazio.
Coisas são: palavras; gestos; emoções; sentimentos; objectos.
Vazio é: ausência de coisas.
As coisas não deviam esbarrar contra a sua ausência, como se a ausência de coisas (isto é: palavras, gestos, emoções, etc.) fosse uma presença. Como se a ausência fosse uma barreira sólida, física, intransponível. Como se o silêncio fosse uma coisa, uma pedra ou uma emoção. Medo, por exemplo.
O medo não é nada porque nunca esbarra contra o que quer que seja. O medo dissipa-se como uma pedra de gelo num café quente (em cujo caso se transforma - e ao café - num mazagran, o melhor dos refrescos).
Ou seja: o medo não é uma coisa porque não pode bater contra a parede da ausência de medo. Não há ausência de medo. Não há uma parede que separe o medo do resto das coisas. Quem diz medo diz outras coisas, claro.
As palavras podem esbarrar contra a ausência de palavras, contra aquilo a que algumas culturas chamam silêncio. As palavras são coisas. A ausência de palavras não é uma coisa. É o vazio.
A ausência de uma pele, um olhar ausente, um corpo que hesita porque há uma parede entre ele e os outros corpos não são coisas.
São o vazio.
(O som é medonho, mas as cantoras são giras.)
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.