6.7.15

Pequenos poermas urbanos

A miúda que está sentada à minha frente no metro é francesa. Sei-o porque a oiço falar ao telefone. Pequenina, daquelas que eu fenderia em dois à primeira investida e em quatro à a segunda se por azar dormisse comigo uma noite. Tem os  seios pequenos, dois perfeitos haiku que sobressaem da blusa leve que veste nesta noite de verão. Está sozinha e fala ao telefone; imagino-a a falar com a do banco do outro lado do corredor, uma portuguesa igualmente magra e pequenina, cujo haiku é o sorriso bonito, comedido que leva no rosto. Sorri como se tivesse acabado de fazer amor; ou de ganhar uma bolsa de estudo em Cambridge; ou de saber que a sua melhor amiga está grávida.

Que se diriam se falassem as duas uma com a outra em vez de falarem ao telefone? Diálogo de dois pequenos e perfeitos poemas urbanos, numa carruagem de metro num dia de semana...

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Degustação de vinhos no Hotel Flórida.

LBV Niepoort 2011. Um poema em forma de vinho, adstringente e denso, com o Parque Eduardo VII ao fundo. O vento norte mantém a temperatura em níveis aceitáveis. Há demasiada gente, não fico muito tempo. O LBV vem comigo, fim de boca no fim da tarde.

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Jam session no Tati. O Gonçalo Marques tem o grupo habitual e está em grande forma. Preparo-me para desafiar a minha crónica alergia à clorofila e vou em breve viver para o campo. Posso viver sem Lisboa, eu sei; mas custa-me não ter os fins de tarde de domingo no Tati.

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Em Paris gosto de ir comer um croissant de manhã enquanto leio o Monde e me fascino de cada vez: como pode um jornal ser simultaneamente tão bom e de esquerda? Em Lisboa não há o Monde nem croissants (há, mas não são a mesma coisa, não estão nos mesmos sítios).

Mas há o café e os croquetes da Versailles enquanto leio o Público (que, forçoso e agradável é reconhecer, está muito melhor agora do que estava há um ano, por muito longe que esteja do Monde).

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Tenho mais sorte, mais cidade, mais tempo e saúde e energia do que tenho dinheiro. Tenho tudo mais do que tenho dinheiro. Antes assim. O contrário seria pior.

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Haiku quotidiano: Ginjinha Sem Rival, na Rua das Portas de Sto. Antão. Duas, sempre, "com uma". A qualidade da bebida não mudou desde que lá comecei a ir, em 1978.

Lisboa é um gigantesco poema eterno composto por uma infinitude de micro-poemas quotidianos.

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Jantar à beira rio. O Sol foge, o azul da água luta para se manter mais um bocado. Vai perder, mas a batalha é linda.

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Há certos olhares que são poemas, também; mas só se vêem nas cidades. A clorofila é um veneno.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.