14.8.15

Michelle, I. (Cont)

"Estou de rastos, desfeita, frágil, vulnerável, cansada e por cima disto tudo, zangada." Michelle falava-me num bar do centro de Barcelona. Quem a visse e não ouvisse - o bar inteiro, eu por vezes incluído - pensaria que me estava a dar notícias dos filhos, a contar um episódio particularmente divertido das férias ou a inventar uma história cómica. Michelle - uma rapariga catalã de pai e mãe franceses - tem uma surpreendente e encantadora capacidade de dissociar a expressão do discurso. "Podia anuncia a morte do pai a rir-se", pensei, enquanto tentava ouvi-la. Fala com um sorriso de orelha a orelha mas fala baixo, e quem a conhece sabe que quanto maior for a dissociação entre o discurso e a expressão e quanto mais baixo falar mais triste está. São essas as maneiras de dizer Estou triste, mortalmente triste.

Estamos num bar do centro de Barcelona chamado Casa Almirall, um bar bonito, antigo e com excelente música. É sexta-feira, o bar está cheio. Michelle é uma habituée. Bebe muitos Vermutes, servidos na Casa Almirall à moda antiga, com um sifão (que ela não usa - isso não a impede de reclamar quando o barman, que a conhece há anos, não traz e põe ao lado do copo).


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