Em Setembro do ano passado fui contratado para trabalhar numa embarcação de cinquenta pés - um Catana 50 - na Flórida. Passo muitos pormenores (juntos não chegam para fazer um pormaior). Cheguei a West Palm Beach dia 12 de Outubro. O objectivo era preparar o barco para o levar para as Bahamas e aí prepará-lo para ficar em seco por etempo indeterminado. A lista de coisas a fazer que me foi enviada era pequena e fácil.
O barco tinha muitos mais problemas do que os que faziam parte dessa lista, o que em si está longe de ser raro, antes pelo contrário. Mas neste caso duas coisas chamaram-me a atenção: os problemas eram todos eléctricos e eram muitos, alguns deles coisas que não acontecem frequentemente; e todos os aparelhos eléctricos, ou quase todos, pareciam padecer de um mal ou outro.
Contratei uma electricista para fazer as reparações e - naturalmente - os custos começaram a exceder largamente o que era previsível se as coisas a fazer fossem efectivamente as que constavam da ToDo, como lhe chamo quando trabalho em inglês (em português chama-se aFazer). Cheguei também rapidamente à conclusão que tantas avarias eléctricas tinham de ter uma causa comum; estando na Flórida essa causa só podia (ou tinha fortes probabilidades de) ser um raio.
Neste momento duas coisas aconteceram: os armadores mandaram-me parar tudo - parar, congelar, suspender -; e iniciei os procedimentos para que os custos fossem cobertos pelo seguro.
A espera pela decisão dos seguros pareceu-me agoniante: não podia fazer nada que envolvesse custos, estava a viver num barco que não tinha condições adequadas - se os armadores fossem outros teria pedido para ir para um hotel -. Mas tinha a certeza de que os seguros cobririam as reparações e portanto a agonia era relativa. Na verdade não foi uma agonia; e se comparada ao que estava para vir. não passou de um ligeiro aborrecimento, uma contrariedade, uma arrelia.
Salto meia-dúzia de pormenores. Os armadores tinham feito um erro com os seguros e estes declinaram a reclamação. O montante das reparações oscilava entre cinquenta e duzentos mil dólares, consoante se fizesse uma reparação a minima ou não, por um lado; e fosse ou não preciso substituir o mastro, que é de carbono e podia estar danificado, por outro.
Os armadores decidiram vender a embarcação por aquilo que só pode ser designado por "uma ninharia" (tenho arrepios quando digo coisas destas, mas ninharia é o termo: duzentos mil dólares um barco que quatro meses antes lhes havia custado setecentos mil, ou lá perto - aos quais se devem adicionar umas largas dezenas que gastaram em baterias de lítio estupidamente caras e outros "pequenos" trabalhos).
O meu contrato acabava a quatorze de Novembro. Os armadores deram-me a escolher entre vir-me embora ou ficar na Flórida sem salário, só com um per diem. Escolhi ficar. É importante dizer aqui que eles não me prometeram fosse o que fosse. As condições eram claras: ou o per diem - suficiente para comer sem luxos nem excessos e mais nada - ou desembarcar.
Os armadores eram dois jovens irmãos que conheci no Panamá há uns anos. Esta foi a terceira vez que trabalhei para eles: encontrei-os em Shelter Bay, Panamá; depois em Galveston, Texas; e agora esta. São pessoas que conhecem muito pouco de barcos e a quem eu sentia que estava em dívida (dívidas, no plural: por duas vezes tiraram-me, sem o saber, de situações difíceis). Sempre foram correctos comigo. Corriam, uma vez mais o risco de ser enganados. Pensei que o meu lugar era a bordo até o barco ser vendido ou conseguíssemos mudar a decisão do seguro.
O barco tinha muitos mais problemas do que os que faziam parte dessa lista, o que em si está longe de ser raro, antes pelo contrário. Mas neste caso duas coisas chamaram-me a atenção: os problemas eram todos eléctricos e eram muitos, alguns deles coisas que não acontecem frequentemente; e todos os aparelhos eléctricos, ou quase todos, pareciam padecer de um mal ou outro.
Contratei uma electricista para fazer as reparações e - naturalmente - os custos começaram a exceder largamente o que era previsível se as coisas a fazer fossem efectivamente as que constavam da ToDo, como lhe chamo quando trabalho em inglês (em português chama-se aFazer). Cheguei também rapidamente à conclusão que tantas avarias eléctricas tinham de ter uma causa comum; estando na Flórida essa causa só podia (ou tinha fortes probabilidades de) ser um raio.
Neste momento duas coisas aconteceram: os armadores mandaram-me parar tudo - parar, congelar, suspender -; e iniciei os procedimentos para que os custos fossem cobertos pelo seguro.
A espera pela decisão dos seguros pareceu-me agoniante: não podia fazer nada que envolvesse custos, estava a viver num barco que não tinha condições adequadas - se os armadores fossem outros teria pedido para ir para um hotel -. Mas tinha a certeza de que os seguros cobririam as reparações e portanto a agonia era relativa. Na verdade não foi uma agonia; e se comparada ao que estava para vir. não passou de um ligeiro aborrecimento, uma contrariedade, uma arrelia.
Salto meia-dúzia de pormenores. Os armadores tinham feito um erro com os seguros e estes declinaram a reclamação. O montante das reparações oscilava entre cinquenta e duzentos mil dólares, consoante se fizesse uma reparação a minima ou não, por um lado; e fosse ou não preciso substituir o mastro, que é de carbono e podia estar danificado, por outro.
Os armadores decidiram vender a embarcação por aquilo que só pode ser designado por "uma ninharia" (tenho arrepios quando digo coisas destas, mas ninharia é o termo: duzentos mil dólares um barco que quatro meses antes lhes havia custado setecentos mil, ou lá perto - aos quais se devem adicionar umas largas dezenas que gastaram em baterias de lítio estupidamente caras e outros "pequenos" trabalhos).
O meu contrato acabava a quatorze de Novembro. Os armadores deram-me a escolher entre vir-me embora ou ficar na Flórida sem salário, só com um per diem. Escolhi ficar. É importante dizer aqui que eles não me prometeram fosse o que fosse. As condições eram claras: ou o per diem - suficiente para comer sem luxos nem excessos e mais nada - ou desembarcar.
Os armadores eram dois jovens irmãos que conheci no Panamá há uns anos. Esta foi a terceira vez que trabalhei para eles: encontrei-os em Shelter Bay, Panamá; depois em Galveston, Texas; e agora esta. São pessoas que conhecem muito pouco de barcos e a quem eu sentia que estava em dívida (dívidas, no plural: por duas vezes tiraram-me, sem o saber, de situações difíceis). Sempre foram correctos comigo. Corriam, uma vez mais o risco de ser enganados. Pensei que o meu lugar era a bordo até o barco ser vendido ou conseguíssemos mudar a decisão do seguro.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.