Ontem as flores caíram do alforje. Voltei para trás para as apanhar e um jovem casal já lá estava. A miúda - vinte e qualquer coisa, trinta e muito poucos - diz-me "eu apanho-as, mas não sei se te importas com o vírus?"
Digo-lhe que não, claro. Não me importo nada. Tem um sorriso bonito, amplo, aberto, igual ao dos olhos. Nem ela nem o namorado têm máscara.
Amaldiçoei o vírus, que nem a mais simples cordialidade deixa em paz. É esta a nova normalidade? Metam-na num certo sítio, vós que a aclamais e desejais.
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Está domingo, procuro um sítio para almoçar, acabo na plaça d'es Coll. O Ambrus tem a vantagem da localização e uma desvantagem de talha: a cozinha não é grande coisa. Não tanto a elaboração, mais a matéria prima. Resta-me o consolo de ter de pedalar pouco até à sesta.
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Calor veranil. É o primeiro este ano. Parece-me bem que calhe a um domingo: torna-se difícil destrinçar a modorra dominical da sasonal. Misturam-se as duas numa abençoada indiferença, nem o vento agita seja o que for. A pele deixa de ser uma barreira e dissolvo-me tranquila, pacificamente na praça, cujo silêncio não é total por causa da clientela do café d'en Coll, que é barulhenta por natureza e descrente por ignorância.
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Nós, ateus, temos com o divino e com os mistérios uma relação muito mais sã do que os crentes. Não acreditar em qualquer coisa de que se sente a presença quotidiana é o equivalente para o espírito do ginásio para o físico.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.