Intersecções: se fores para a esquerda morres de uma coisa qualquer; se fores para a direita morres também, mas de outra coisa. Na dúvida, escolhes as duas. Vais primeiro para a esquerda, depois para a direita. Morres atropelado primeiro e do coração depois, por exemplo, um pouco à imagem do pão que se coze duas vezes para durar mais. A única morte que recusas é o afogamento: como morrer daquilo que te fez viver?
Estira-te nessa ideia de morte que te persegue. Não és viável, pelo menos para os padrões da modernidade. Pertences àquela raça de portugueses que ficou sem trabalho, uma vez descoberta a Índia, não é? Sem trabalho e sem vida, sem sono e sem sonhos.
Ou seja: não morras nem na Índia nem dela a caminho. Morre nuns braços que te estreitem até te virarem do avesso. Morre enfiado no corpo que amas, numa floresta a meio da tarde. Morre num adeus mudo à cidade onde foste amado. Morre onde e quando quiseres, mas deixa a Índia em paz: devolveste-lhe a vida, ficaste sem trabalho: que esperavas?
Vive nas intersecções: é o único mundo que conheces, que te conhece. Morre devagar: nunca foste de pressas. Até nos abismos te precipitaste devagar.
Escolheste os dois lados da vida e ela agora limita-se a dar-te o troco.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.