5.1.21

Basalto, vazio

O bom senhor António espera no seu canto qualquer coisa que não sei bem o que seja. Talvez uma Antónia que não conheço nem sei por onde anda. Louis Armstrong toca para o café vazio. Tenho fome e penso que seria boa ideia ir para casa. O café não tem Ricard. 

- Acabou agora mesmo, com aquele senhor que está no balcão - diz-me a empregada. É simpática, espigadota e tolera a ausência de máscara.

Não tenho nada a ver com tudo isto. É exterior, são coisas que giram à minha volta mas do lado de fora de mim. Nem a fome vem de onde devia vir. Penso naquelas cadeiras de carrossel suspensas por correntes que a força centrífuga faz levantar e chegar quase à horizontal. Algumas das cadeiras separar-se-ão, irão por esse vazio fora; outras, mal o carrossel pare, cair-me-ão aos pés e por ali ficarão, restos vazios de um dia sujo, vazio, parado. Nada disto faz parte de mim. Nada disto sou eu. Nada disto, nada. Não sou senão este corpo que não pára de fingir já ter sido meu e que não paro de encher de basalto e de vazio.

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