Vives na margem ou à margem? Não derivas lentamente para a fronteira: vais pelo teu pé. É questão de essência, dizem-te ao ouvido. É, sem dúvida: quanto mais mergulhas na tua essência mais perto da margem te encontras.
Essência é uma palavra bonita. Tem a ver com eflúvios, com cheiros, com o que está dentro e se espalha, se dá sem se dar a ver, se sente mas não se toca. A tua essência é a margem: "comecei a fugir para dentro. / É cada vez mais difícil deixar de fugir para dentro." Estes versos leste-os há mais de quarenta anos. Não te largaram nunca: são a tua essência. Dentro de ti está a margem, é para ela que foges. Fizeste de essência um sinónimo de margem, de solidão um de escolha, aprendeste a fugir lentamente, muito devagar, pé ante pé não fosse a essência dissipar-se, fugir ela também. A essência esconde-se. Para a encontrares, precisas de um pincel, de uma caneta, de um arado, de uma voz que pouco a pouco se liberte, de uns olhos que te deixem ver ao longe e para dentro, simultaneamente, de um ouvido encostado ao peito. Precisas de ti, de ser tu, de seres todo, o todo. Precisas de uma margem em direcção à qual avanças, tacteias e te encontras, finalmente: és a essência, és a margem, és tu, toda nua.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.