9.4.21

Diário de Bordos - Genebra, Suíça, 09-04-2021

Lá fora a temperatura está a dezassete graus, mas a temperatura dentro de casa é insuportável de quente. É preciso abrir as janelas. Acontecia o mesmo de manhã, quando a temperatura exterior era de dez graus ou menos. O hábito das casas aquecidas é como o dos carros automáticos: adquire-se depressa e esquece-se devagar.

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Na televisão, um dos directores da RTS (Rádio Televisão Suíça) explica que o ano de 2020 foi um ano recorde em espectadores, publicidade e tudo, tanto no digital como nos meios tradicionais. S. não faz a ligação com a Covid e eu pergunto-me: «qual a percentagem de pessoas que a faz»?

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Num museu do Locle (cantão de Neuchâtel) a exposição chama-se «Vide» (Vazio) e consiste em paredes brancas. Serve para «chamar a atenção para a frustração dos artistas com os confinamentos, etc.» (cito de memória). A ideia é excelente, eloquente. Imagino todos os músicos de rua em Portugal numa acção semelhante: parados, quedos, mudos, com os instrumentos. Ver se assim as pessoas conseguem medir o que estão a perder.

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É inútil, eu sei: o medo é uma avalanche que leva tudo pela frente. A começar pela racionalidade. Quem viu imagens de uma avalanche a destruir casas percebe o que quero dizer. Não há alicerces - sejam físicos sejam teóricos - que resistam.

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Mais um colóquio na calha. Preferiria o nome de  Chautauquas, roubado do Zen and the Art of Motorcycle Maintenance, um livro no qual penso cada vez mais (como se fosse possível). 

«With this, the book details two types of personalities: those who are interested mostly in gestalts (romantic viewpoints focused on being "in the moment", and not on rational analysis), and those who seek to know details, understand inner workings, and master mechanics (classic viewpoints with application of rational analysis, vis-a-vis motorcycle maintenance)

«The narrator examines the modern pursuit of "Pure Truths", claiming it derives from the work of early Greek philosophers who were establishing the concept of truth in opposition to the force of "The Good". He argues that although rational thought may find a truth (or The Truth) it may never be fully and universally applicable to every individual's experience. Therefore, what is needed is an approach to life that is more inclusive and has a wider range of application. He makes a case that originally the Greeks did not distinguish between "Quality" and "Truth"—they were one and the same, arete—and that the divorce was, in fact, artificial (though needed at the time) and is now a source of much frustration and unhappiness in the world, particularly overall dissatisfaction with modern life

O livro é de 74 e é provavelmente o que melhor descreve os tempos. Ou os pensa.

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Um conto publicado na Caliban. Reagi como uma criança, prova de que nem tudo está morto em mim. Só adormecido.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.