16.5.21

Léxico, liberdade et al.

As palavras não fazem o mundo em o desfazem. Limitam-se a fazer-nos no mundo, tecer a relação que temos com ele, com a sua história, com o que desejamos ou esperamos dele. Trocar cego por invisual não dá vista a quem não vê, mas dá a quem faz a troca uma ideia do mundo e de si próprio. Ideia essa que depois exporta a quem o ouve ou lê.

O problema começa nessa exportação, em querer torná-la obrigatória. Admitidamente,  uma sociedade tem regras às quais é preciso aderir; e as palavras evoluem semanticamente e hoje têm um conotação  - e frequentemente uma denotação - diferentes das que tinham ontem e terão amanhã. Isso é aceitável. 

Só contesto é que me imponham regras em nome de um mundo que não vejo da mesma forma que quem mo impõe. Contesto que me imponham um vocabulário em nome de uma visão do mundo que não partilho. Não há ninguém mais tolerante do que eu a respeito do que cada um faz com o seu corpo. Essa liberdade que reivindico para mim, essa tolerância com que recebo o outro manifestam-se no meu vocabulário. Sobretudo quando estou em minha casa. Quando não estou, adiro às regras do anfitrião.  Mas adiro voluntariamente, porque quero aderir, porque acredito em determinados valores comuns. Não por que alguém no impôs. 

"A liberdade consiste em cada um poder escolher as suas prisões", disse não sei quem. A liberdade consiste em cada um poder escolher o seu léxico, acrescento eu.

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