Há quem acredite que comprar bilhetes do totómilhões é um investimento razoável ou que Jesus transformou água em vinho; na Idade Média, quase toda a gente acreditava que os surtos de peste foram debelados graças às orações e ao Divino. Há uma certa racionalidade nisto: a melhor explicação para um fenómeno é a mais fácil, a mais evidente, a que está à mão de semear, por assim dizer. Já a ciência, o método científico exigem investigação. Um cientista investiga, não crê. Põe em causa, não aceita. Por outro lado, as religiões sempre foram o antídoto para o medo. Os marinheiros eram religiosos porque precisavam de um aliado na sua faina num meio que eles sabiam ser infinitamente mais forte do que eles. O medo - um fenómeno eminentemente racional ou pelo menos racionalizável - leva naturalmente à religião, à crença de que alguém está ali para nos ajudar.
O que se está a passar com a Covid tem tudo de um fenómeno religioso: o pânico levou à crença histérica em procedimentos que são tão eficazes na «luta contra o vírus» (esta expressão faz-me lembrar «luta contra o mar», como se alguém alguma vez na vida tivesse sequer sonhado com lutar contra o mar) como as rezas dos marinheiros eram para aplacar os temporais. Não aplacavam nada senão o medo. Davam-lhe um porto de abrigo. Acolhiam-no e levavam-no para o céu. Quantas vezes com os ditos marinheiros atrás, de resto.
A crença religiosa e a crença na aficácia das vacinas têm muito em comum. Incluindo, apercebi-me hoje quando espicaçado por um amigo pró-Covid, de que a comunhão também tem duas fases, como as vacinas: a «Tomai e comei, este é o meu corpo» segue-se «tomai e bebei, este é o meu sangue». Primeira fase e segunda fase. QED.
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