14.7.21

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 14-07-2021

A seis euros não há más pizzas (se fosse pedante diria pizze. Felizmente não sou. Ou sou e sei disfarçar muito bem.) Esta não foge à regra: é uma merda. Felizmente o vinho tão pouco é grande coisa. Assim não há desequilíbrios. O dia escorrega lentamente para o fim. Amanhã de madrugada vou para Barcelona. Acho injusta e discriminatória esta prática de as companhias aéreas porem os voos mais baratos para horas impossíveis. Quem me garante que amanhã às cinco da manhã estou acordado? E às cinco e meia na paragem do autocarro? Porque é que os táxis não são mais baratos? Porque gosto tanto deste fim de dia, fim de ciclo? Porquê me custa tanto deixar Palma-a-sedutora, Palma-a-calma, Palma-a-suave? O P., claro. Mas não só. Ainda por cima, nem sequer os deixo: não tarda estou aqui outra vez. Estou a ficar piegas, ou a abrir mais facilmente a porta à melancolia. Verdade seja dita, sempre a teve aberta. É visita da casa há muito tempo. Por isso deixo o dia fazer de mim um escorrega; sinto-o deslizar como se fosse a sua última descida numa pista de ski: já só a gravidade trabalha. Hoje a gravidade é universal, é uma gravidade galáctica, planetária, astral, astronómica, metafísica, sentimental, meio amaricada. 

Provavelmente por isso saio do sítio onde comi a pizza de merda e venho ao Divino: "Núria, preciso de vinho e de crédito. Tens os dois ou só um?" Sabia a resposta, claro e agora regalo-me com um Chianti magnífico e com melenzane sott'oglio. Toda a gente devia conhecer o Roberto e prometo a toda a gente que vier a Palma: peçam-me a morada. Eu dou-a, não a vendo. O Roberto é siciliano, a Nuria de Barcelona e os dois fazem a metade ocidental do Mediterrâneo. Isto é, explicam porque é que este mar é a minha casa. Uma das minhas casas. 

.........

Amanhã vou para Barcelona. Um novo ciclo começa e penso que se é fácil sair do P., é impossível tirar o P. de mim. Mas não é fácil. Foi precisa uma garrafa inteira de Chianti, que acabo agora com um sentimento de dever cumprido (o do Chianti, não o do P., que tem dois furos na barriga e mais meia dúzia de mazelas velhas, que estão a ser reparadas ao ritmo da chuva no Sahara). Para quem, como eu, não acredita em maus olhados, sortes ou "casos", aquele bote é uma bela prova. No sentido de provação.

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