15.9.21

Aceitacionismos, razão,liberdade et al.

Ser corajoso não é não ter medo. Isso é ser idiota. Ser corajoso é vencer o medo. Deixar-se vencer por ele é ser cobarde. Cobardolas. Medricas. Mariquinhas pé-de-salsa. Forçoso é reconhecer, contudo, que por vezes a cobardia ganha. Somos humanos imperfeitos, não somos máquinas perfeitas e infalíveis. Às vezes a cobardia ganha e compreende-se - isto é, aceita-se.

Já a estupidez - sobretudo quando vem de pessoas inteligentes - é mais difícil de aceitar. Os estúpidos - grupo do qual faço parte, com grande pena e revolta - têm pelo menos a desculpa da deficiência cognitiva. Os inteligentes - grupo no qual tento escolher os meus amigos, porque para sair com iguais ou piores do que eu basta-me sair comigo - quando fazem ou dizem uma estupidez não têm essa desculpa. Ficam ali, sozinhos no meio da estrada, vestidos (ou despidos) com os farrapos de inteligência que o medo, condescendentemente, lhes deixou.

Ver uma pessoa inteligente desperdiçar esse dom para ceder ao medo está para lá do que se pode aceitar. É desolador, como ver um mendigo nu e esfomeado à porta de nossa casa e não poder ajudá-lo.

Pensar que o livre arbítrio, a liberdade, a razão - tudo aquilo por que o século XIX lutou - vai para as urtigas com um vírus é revoltante. Para a maioria das pessoas a liberdade e a razão não são armas suficientes para lutar contra o medo. O irracionalismo - escola filosófica que fez as delícias da minha adolescência  e abandonei mal cresci um pouco - afinal estava certo. 

A esquerda já foi a ideologia da luz, da razão, da ciência,  da revolta e do progresso. Hoje está reduzida ao aceitacionismo irracional. Não é por acaso que a maioria dos «negacionistas» invoca a liberdade e usa dados objectivos para defender as suas opiniões. 

Volta, Friedrich. Esquece o supra-homem e volta. Estás perdoado.

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