13.10.21

Diário de Bordos - Genebra, Suíça, 13-10-2021

Ontem passei à frente da Coop (uma das duas cadeias suíças, identitárias, de supermercados) às sete e dez da noite. Estava fechada. Não ia fazer compras, vinha de casa de um amigo, mas percebi que uma das coisas que sempre impossibilitou a minha vida em Genebra é esta discrepância entre horários internos e horários externos. É como eu dançar com uma senhora que dança extremamente bem: não há maneira de acertar os passos. A verdade é que me adaptei à maioria das coisas, mesmo aos preços, eterno tema de piadas familiares - não é a Suíça que é cara, eu é que sou um teso. Mas este permanente desajuste de relógios era - ainda é - difícil. 

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Fui fazer um teste antígeno (mais um...). Foi de manhã, por volta das onze e meia. Acabo neste preciso instante (seis da tarde) de receber uma mensagem do médecin cantonal (a DGS do cantão). O laboratório onde fiz o teste enviou-lhes o resultado. É de certeza obrigatório. Esta é outra das coisas que sempre detestei. A eficácia da burocracia é um pau de dois bicos. Se tivesse de escolher, prefiriria uma burocracia inapta, incompetente, anedótica como a portuguesa. Dou-me melhor com o caos do que com a ordem, apesar de esta ser bastante atractiva, esporadicamente. Felizmente posso alterná-las. E acrescentar-lhes a total ausência dos dois que é o mar. Alternadamente.

Mentira: o mar não é a ausência de ordem e de caos. É o seu (deles) ponto de confluência, onde se encontram, onde jogam às escondidas, onde fingem ser cada um deles o outro, um loop contínuo que depois se desfaz em terra, como um aguaceiro: de um lado a ordem, do outro o caos. No mar tudo é ordem e tudo é caos.

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Último jantar desta estadia em Genebra (solitário, S. foi trabalhar a França): carne guisada «à casa» (sinónimo de mixórdia super-picante), absinto, Leonard Cohen (sinónimo de melancolia), impaciência, saudades e uma Syrah «biológica e sem sulfitos», a seu tempo. Ao desenraizamento vou acrescentar uma categoria: o dilaceramento. (Exercício inútil: não saberia viver sem ele. Sem eles.)

E ao caos um território: as emoções.

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Projecto para o futuro: ler e escrever. «L'intendance suivra.»

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