8.5.24

Diário de Bordos - Marigot, Saint-Martin, DOM-TOM França, 08-05-2024

Esta ideia de que um bolo só aguenta uma cereja tem de ser revista. Cada vez me convenço mais de que cabem muitas mais cerejas em cima de cada bolo. A chuva não pára mas isso faz parte do bolo. Amargo, é preciso dizê-lo? As cerejas são outras: hoje é feriado em França, dia da «Vitória» (aspas porque é irónico, refere-se à «vitória» da França na Segunda Guerra Mundial) e amanhã também: Ascenção. Sexta metade da população do país (ilha incluída) faz ponte e só por milagre terei notícias antes de segunda-feira.

Entretanto já lancei os seguros. O óptimo é inimigo do bom e com esta sucessão de feriados e fim-de-semana prefiro ir directamente para a pior das hipóteses. 

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O palito para as cerejas não pára de crescer. Vá lá que ao menos o bolo é grande e aguenta-as todas. Ele são as portas USB do computador, ele é o telefone, ele é o P. que sem mim não quer saber de mim. 

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Louvada seja a ironia. Que seria de mim sem ela?

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Fiz pão e ficou bom. Levei uma marretada com uma proposta do proprietário que me deixou completamente abananado (abasourdi, para quem preferir a língua local). Estou infinitamente grato ao S. D.: é a única coisa neste momento que me dá um rumo. Sei o que hei-de fazer porque sei o que tenho de lhe fazer. Se me pusesse no exterior de mim veria um velho marinheiro a bambolear no cais, garrafa de rum vazia na mão esquerda e cigarro apagado na direita. No outro dia disse ao Jim que aprendi finalmente a escolher os meus clientes. Wishful thinking, Luisinho. Não reclamo: para começar é tarde e para continuar tenho culpas no cartório. Se a mesma coisa te acontece vinte vezes a culpa não é das coisas. É tua. Isto sem esquecer que culpa ou não, a responsabilidade está lá, do teu lado. É coisa que nem te nem se abandona. É tua e só tua. O tempo em que tu eras vítima da família, da sociedade, da Igreja, do código genético, de uma mãe assim ou de um pai assado acabou faz uma data de anos. Portanto, meu caro, agarra-te ao brandal, mija para sotavento e volta para o poço. Quando isto passar poderás beber um rum. Tens uma vantagem: já por aqui navegaste muitas vezes, por nova que seja a proposta do outro. E reflectindo bem, nem sequer é assim tão novidade. É só inesperada, vinda de quem vem. Vai deitar-te, homem. Vai ler, vai dormir, vai sonhar. Sempre te distrais um bocadinho e deixas o mundo em paz.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.