11.5.24

"O acaso e a necessidade"

Não sou grande adepto da teleologia, a ideia de que as coisas acontecem com um objectivo. Tão pouco acredito no voluntarismo, no poder da vontade. Não basta querer. É preciso querer, poder, sorte... A receita da vitória é complexa, a proporção dos ingredientes varia. O motor do universo é o acaso, que por vezes se faz acompanhar da sorte e ou da competência e dá bons resultados. Outras vezes o combustível é o azar, a incompetência,  a ganância e temos asneira garantida. Um exemplo recente desta mistura fatal foi a gestão da Covid-19.

Reconheço contudo à teleologia e às suas numerosas primas conspirativas uma qualidade: são  reconfortantes. Se bem eu não perceba de todo qual o ganho que alguém pode extrair de me ver bloqueado em Saint-Martin com o bote a meter água, ou qual o objectivo, ficaria extremamente satisfeito se alguém me demonstrasse por a mais b que estou aqui porque se não estivesse morreria afogado no meio do Atlântico, por exemplo. Ou que há uma conspiração dos estaleiros da ilha e dos iatistas aqui presentes para me reterem e me retirarem os tripulantes.

Claro que acredito piamente que se rezasse muito à Virgem à água deixaria de entrar - tal como se jogasse ao totómilhões ganharia o primeiro prémio. Bastaria querer, em qualquer dos casos. 

Não vou fazer nada disso. Vou esperar por segunda-feira. O calendário é imune ao acaso e não tem a mais pequena ideia, opinião, vontade ou desejo sobre o que eu vou fazer com os dias. 

Tenho que estudar melhor as interacções dos deuses e dos demónios (ou de Deus e do demónio, para os monoteístas). Ainda não percebi se jogam uma espécie de ping-pong cósmico em que cada um detém a bola à vez ou se fazem parte da mesma equipa, alternando de vez em quando aquele que marca os golos.

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