«Rir torna-nos invencíveis. Não como quem vence sempre, mas como quem não desiste. »
Frida Kahlo.
5.12.08
Facilidades
"É tão mais fácil amar o imperfeito"- é, sem dúvida. E mais arriscado também, não lhe parece, Luísa (já agora: welcome back)? Imagine que o imperfeito não retribui o nosso amor...
Luís, mas o amor puro e genuíno não requer retribuição!!! Essas contabilidades de deve-e-haver são coisas da paixão. ;-D E o imperfeito terá, pelo menos, a vantagem de apreciar o amor que lhe votam, mesmo que não consiga retribui-lo. O perfeito é demasiado auto-suficiente.
O problema, cara Luísa, é que se acaso o imperfeito não retribui o amor é pior ainda - uma "tampa", perdoe-me o coloquialismo, devido sem dúvida ao adinatado da hora, da Claudia Schiffer é provavelmente (é uma intuição, não uma certeza científica) melhor suportada do que um sim apaixonado de uma senhora gorda, careca e desdentada. Ou, para o "outro" género (que por acaso é o seu, mero acaso) substitua Claudia Schiffer por Paul Newman, e senhora por senhor.
Quanto à ideia de que o amor puro e genuíno não requer retribuição - é uma ideia que requer discussão. Nem os santos a dispensam...
Luís, na história muito limitada dos meus amores, não sei se alguma vez fui retribuída. Nunca ninguém mo declarou expressamente (a Ana Vidal diria que por preconceito geracional contra verbo amar; eu digo que por pragmatismo); nunca ninguém me ofereceu flores (sob o pretexto de que não faziam o meu género); nunca ninguém me ofereceu diamantes (embora eu ache que fazem o meu género); e só me lembro de me oferecerem alguns bons jantares nalguns bons restaurantes (logo a mim, que não pareço, nem sou, um bom garfo). Ainda assim, a história dos meus amores é uma história feliz. Não tanto porque sempre consegui o que realmente (e modestamente) queria, como porque sempre fui tratada com muita delicadeza. É que não é a reciprocidade amorosa que me conquista, mas sim a lucidez, a doçura e a «politesse», como diz a Marguerite Yourcenar.
O seu comentário, Luísa - que é, deixe-me começar por aí, de uma beleza e uma "justeza de tom" extraordinários - suscita-me tantas reflexões que quase me perco no turbilhão.
Na realidade também li o post da Ana; não concordei com ele. Eu faço, parece-me, parte da faixa etária a que refere e não descortinei - nem em mim nem no meu círculo de amigos e conhecidos - qualquer reticência a manifestações de amor. Penso que a resistência que a Ana menciona tem outras origens que não a idade: ou classe social, ou "grupo cultural" (espero que não haja sociólogos a ler isto, se não lá vamos ter que perder algumas horas a clarificar este conceito), ou tão-só, idiossincracias pessoais (não acredito muito, mas não a excluo totalmente);
Há indubitavelmente um aspecto cultural no caso, por exemplo, das flores: oferecê-las é um dos meus maiores prazeres (enfim, normalmente o que fica a montante da oferta: a escolha e composição do ramo, que tento adaptar à pessoa que o vai receber) e posso garantir-lhe que são raros os homens, quaisquer que sejam as suas faixas etárias, que vejo nos floristas (pelo menos os dois ou três que frequento habitualmente);
Mas esse aspecto cultural reflecte-se nos jantares em bons restaurantes - todos nós,salvo raras excepções, oferecemos aquilo que valorizamos (e podemos, claro, mas vamos por agora pôr de lado este aspecto da questão porque não é o parâmetro determinante), e a nossa cultura é indiscutivelmente orientada para a comida - a dos franceses também, repare, mas no caso deles a gastronomia faz parte de um conjunto maior, mais complexo.
Ou seja, há uma retribuição, embora a Luísa não a perceba como tal, explicitamente.
O que nos levaria à frase de abertura do seu primeiro comentário, aquela que menciona "amores puros e genuínos" - cedendo à tentação do debate (que continuo, infelizmente, a não ver adequado às caixas de comentários) são, a meu ver, aqueles que nao só requerem como exigem retribuição. Um amor não correspondido e que se mantém para lá de uma período razoável, curto e proporcional à duração da ilusão não é puro nem genuíno. É doentio, mórbido e inconveniente. Se esse amor fôr simétrico, haverá, inevitavelmente, uma retribuição (quanto mais não seja, o próprio amor, mas isso é pano para mais mangas do que as que cabem numa caixa de comentários...)
A ideia de "desinteresse", na acepção mais vasta e abrangente do termo, seja ela aplicada ao amor, à amizade, ao trabalho ou à educação dos filhos suscita-me muitas dúvidas e algum cepticismo. Defesa, talvez, de quem se vê imperfeito, humano, inacabado (no sentido de poder mudar), perfectível, impuro - em duas palavras, humano, e vivo.
O que não tira ao amor, nem aos sentimentos em geral, qualquer da sua riqueza, complexidade, interesse ou beleza.
Meus amigos, só me atrevo a interromper este vosso interessantíssimo diálogo porque sou citada. Tiro, como sempre, o chapéu à Luísa pela beleza e justeza de tom (bem dito, Luís!) do seu comentário, e concordo que o amor genuíno e verdadeiro não exige retribuição. Mas é bom que tenha alguma, ou descambará fatalmente em insatisfação, tristeza ou raiva. Ninguém é santo ao ponto de dar eternamente amor a quem não devolve nem uma migalha do que recebeu... E tiro igualmente o chapéu ao invejável equilíbrio e à prudência nas expectativas de que a Luísa nos dá sempre mostras, o que é sempre uma lição para mim. Eu sou mais emotiva e mais exigente, embora a vida já me tenha ensinado a valorizar aspectos que antes desprezava em absoluto.
Quanto às palavras, mantenho que é uma questão geracional e cultural, embora admita que possa ser também um tique de uma certa classe social. Mas o facto de o Luís não reconhecer em si esta dificuldade de expressão nada prova, já que a sua vida de globetrotter desde muito cedo o exclui dos hábitos acanhados deste acanhado rectângulo forrado de preconceitos.
E acabo dando-lhe os parabéns, Luís: os homens raramente vão além das rosas encarnadas, como se fosse a única flor e a única cor possíveis no capítulo das flores! Haja alguém com imaginação e inteligência para personalizar um presente sempre tão especial...
"Imaginação e inteligência", Ana? Temo que não passe simplesmente de um especial dom para escolher fornecedores...
Obrigado, na mesma.
Enfim, uma palavrinha mais: Escolher flores é como escrever, ou fotografar (para falar das duas coisas que sei - ou gosto de - fazer, um bocadinho). E, da mesma maneira que se escreve sempre para alguém, ou que todas as fotografias são um auto-retrato, compôr um ramo de flores é uma mensagem. Comunicação, diria Watzlawick.
Para mim, esse 'imperfeito amor' não requer retribuição. A maior beleza, nesse caso, e se quiser a maior retribuição é a possibilidade de amar e acrescentar. De outra forma, mais equilibrada, não seria imperfeito. Seria o mais-que-perfeito, vivido imperfeitamente, sempre.
Luís, mas o amor puro e genuíno não requer retribuição!!! Essas contabilidades de deve-e-haver são coisas da paixão. ;-D
ResponderEliminarE o imperfeito terá, pelo menos, a vantagem de apreciar o amor que lhe votam, mesmo que não consiga retribui-lo. O perfeito é demasiado auto-suficiente.
O problema, cara Luísa, é que se acaso o imperfeito não retribui o amor é pior ainda - uma "tampa", perdoe-me o coloquialismo, devido sem dúvida ao adinatado da hora, da Claudia Schiffer é provavelmente (é uma intuição, não uma certeza científica) melhor suportada do que um sim apaixonado de uma senhora gorda, careca e desdentada. Ou, para o "outro" género (que por acaso é o seu, mero acaso) substitua Claudia Schiffer por Paul Newman, e senhora por senhor.
ResponderEliminarQuanto à ideia de que o amor puro e genuíno não requer retribuição - é uma ideia que requer discussão. Nem os santos a dispensam...
Luís, na história muito limitada dos meus amores, não sei se alguma vez fui retribuída. Nunca ninguém mo declarou expressamente (a Ana Vidal diria que por preconceito geracional contra verbo amar; eu digo que por pragmatismo); nunca ninguém me ofereceu flores (sob o pretexto de que não faziam o meu género); nunca ninguém me ofereceu diamantes (embora eu ache que fazem o meu género); e só me lembro de me oferecerem alguns bons jantares nalguns bons restaurantes (logo a mim, que não pareço, nem sou, um bom garfo). Ainda assim, a história dos meus amores é uma história feliz. Não tanto porque sempre consegui o que realmente (e modestamente) queria, como porque sempre fui tratada com muita delicadeza. É que não é a reciprocidade amorosa que me conquista, mas sim a lucidez, a doçura e a «politesse», como diz a Marguerite Yourcenar.
ResponderEliminarO seu comentário, Luísa - que é, deixe-me começar por aí, de uma beleza e uma "justeza de tom" extraordinários - suscita-me tantas reflexões que quase me perco no turbilhão.
ResponderEliminarNa realidade também li o post da Ana; não concordei com ele. Eu faço, parece-me, parte da faixa etária a que refere e não descortinei - nem em mim nem no meu círculo de amigos e conhecidos - qualquer reticência a manifestações de amor. Penso que a resistência que a Ana menciona tem outras origens que não a idade: ou classe social, ou "grupo cultural" (espero que não haja sociólogos a ler isto, se não lá vamos ter que perder algumas horas a clarificar este conceito), ou tão-só, idiossincracias pessoais (não acredito muito, mas não a excluo totalmente);
Há indubitavelmente um aspecto cultural no caso, por exemplo, das flores: oferecê-las é um dos meus maiores prazeres (enfim, normalmente o que fica a montante da oferta: a escolha e composição do ramo, que tento adaptar à pessoa que o vai receber) e posso garantir-lhe que são raros os homens, quaisquer que sejam as suas faixas etárias, que vejo nos floristas (pelo menos os dois ou três que frequento habitualmente);
Mas esse aspecto cultural reflecte-se nos jantares em bons restaurantes - todos nós,salvo raras excepções, oferecemos aquilo que valorizamos (e podemos, claro, mas vamos por agora pôr de lado este aspecto da questão porque não é o parâmetro determinante), e a nossa cultura é indiscutivelmente orientada para a comida - a dos franceses também, repare, mas no caso deles a gastronomia faz parte de um conjunto maior, mais complexo.
Ou seja, há uma retribuição, embora a Luísa não a perceba como tal, explicitamente.
O que nos levaria à frase de abertura do seu primeiro comentário, aquela que menciona "amores puros e genuínos" - cedendo à tentação do debate (que continuo, infelizmente, a não ver adequado às caixas de comentários) são, a meu ver, aqueles que nao só requerem como exigem retribuição. Um amor não correspondido e que se mantém para lá de uma período razoável, curto e proporcional à duração da ilusão não é puro nem genuíno. É doentio, mórbido e inconveniente. Se esse amor fôr simétrico, haverá, inevitavelmente, uma retribuição (quanto mais não seja, o próprio amor, mas isso é pano para mais mangas do que as que cabem numa caixa de comentários...)
A ideia de "desinteresse", na acepção mais vasta e abrangente do termo, seja ela aplicada ao amor, à amizade, ao trabalho ou à educação dos filhos suscita-me muitas dúvidas e algum cepticismo. Defesa, talvez, de quem se vê imperfeito, humano, inacabado (no sentido de poder mudar), perfectível, impuro - em duas palavras, humano, e vivo.
O que não tira ao amor, nem aos sentimentos em geral, qualquer da sua riqueza, complexidade, interesse ou beleza.
Meus amigos, só me atrevo a interromper este vosso interessantíssimo diálogo porque sou citada. Tiro, como sempre, o chapéu à Luísa pela beleza e justeza de tom (bem dito, Luís!) do seu comentário, e concordo que o amor genuíno e verdadeiro não exige retribuição. Mas é bom que tenha alguma, ou descambará fatalmente em insatisfação, tristeza ou raiva. Ninguém é santo ao ponto de dar eternamente amor a quem não devolve nem uma migalha do que recebeu...
ResponderEliminarE tiro igualmente o chapéu ao invejável equilíbrio e à prudência nas expectativas de que a Luísa nos dá sempre mostras, o que é sempre uma lição para mim. Eu sou mais emotiva e mais exigente, embora a vida já me tenha ensinado a valorizar aspectos que antes desprezava em absoluto.
Quanto às palavras, mantenho que é uma questão geracional e cultural, embora admita que possa ser também um tique de uma certa classe social. Mas o facto de o Luís não reconhecer em si esta dificuldade de expressão nada prova, já que a sua vida de globetrotter desde muito cedo o exclui dos hábitos acanhados deste acanhado rectângulo forrado de preconceitos.
E acabo dando-lhe os parabéns, Luís: os homens raramente vão além das rosas encarnadas, como se fosse a única flor e a única cor possíveis no capítulo das flores! Haja alguém com imaginação e inteligência para personalizar um presente sempre tão especial...
"Imaginação e inteligência", Ana? Temo que não passe simplesmente de um especial dom para escolher fornecedores...
ResponderEliminarObrigado, na mesma.
Enfim, uma palavrinha mais: Escolher flores é como escrever, ou fotografar (para falar das duas coisas que sei - ou gosto de - fazer, um bocadinho). E, da mesma maneira que se escreve sempre para alguém, ou que todas as fotografias são um auto-retrato, compôr um ramo de flores é uma mensagem. Comunicação, diria Watzlawick.
Elementar, diria Holmes.
ResponderEliminarMas nem sempre o elementar em comunicação é entendido como tal, por isso mantenho os parabéns.
:-)
Para mim, esse 'imperfeito amor' não requer retribuição. A maior beleza, nesse caso, e se quiser a maior retribuição é a possibilidade de amar e acrescentar. De outra forma, mais equilibrada, não seria imperfeito. Seria o mais-que-perfeito, vivido imperfeitamente, sempre.
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