Vai pelo Jugular um grande debate sobre a excisão. Começou com um senhor (ou uma senhora, não sei mas penso que não) que se manifestou contra todas as formas de ingerência em culturas alheias (no seu último comentário menciona a aculturação como se fosse a raiz do pecado - "usando as elites locais aculturadas para abater resistências") [resistências à excisão, note-se - imagino que sejam, para ele, particularmente ilegítimas. Nenhuma sociedade tem o direito de evoluir (ou mudar, se quisermos usar um verbo menos polémico); e muito menos se for por influência de uma sociedade que se crê "melhor". Que haja mais gente desses países a querer vir para o Ocidente do que ocidentais a querer ir para lá parece indicar que sim. Mas enfim, cada um tem os seus critérios.]
Já tive centenas - centenas - de discussões destas. Sobre a excisão, Israel, a democracia em África, o apartheid. Nunca mais: é impossível discutir (pelo menos quem, como eu, não é um intelectual), porque estamos em patamares epistomológicos diferentes. Podemos falar do mal com quem do mal tem uma opinião diferente da nossa. Mas não com quem não reconhece o mal (mal, bem - podem substituir por qualquer outro valor. Ou até cores: podemos debater se um encarnado é mais ou menos acastanhado; mas se onde nós vemos encarnado o nosso interlocutor vê azul, ou cinzento, nada há a discutir - a menos que se ande permanentemente com um espectómetro, o que não é o meu caso. E mesmo assim ainda pode haver desacordo quanto aos termos que designam um dado comprimento de onda).
Quando cheguei à Suíça caí num meio universitário, esquerdista daqueles a que eu chamava esquerda zeitgeist, às vezes e esquerda religiosa outras (quando os queria chatear um bocadinho) - a mesma que encontramos hoje a clamar contra o aquecimento global, Israel (esse é um tema perene, infelizmente) etc.. Discutia-se invariavelmente o apartheid. Eu dizia-lhes que o apartheid do qual eles estavam a falar não existia. Havia outro - que eu não aprovava, obviamente - mas que não era, de todo, aquilo de que eles estavam a falar.
Um dia convidei um sul-africano preto, um magnífico músico de jazz que morava em Genève e um branco, da uppercast, para um jantar em minha casa. Eles e os excitados (iam falar com um preto sul-africano pela primeira vez na vida) defensores dos direitos humanos, etc.. O choque daquela gente quando ouviu o Henry (era o músico) a dizer exactamente - palavra por palavra - o que eu lhes dizia é indescrítivel; corroborado pelo outro, o melhor skipper que jamais trabalhou para mim. Eles não percebiam: como é que um preto, sul-africano, músico (artista!, e bom, ainda por cima) casado com uma loira sublime e inteligentíssima podia dizer coisas daquelas? Que um branco das classes superiores dissesse, compreendia-se. Mas um preto? Era o desabar de um mundo - e a melhor maneira de lutar contra isso é, então como hoje, pura e simplesmente ignorar - no sentido primeiro do termo, como um cego de nascença ignora o encarnado - os argumentos do outro. [E, claro, mencionar a aculturação dele, a sua tremenda alienação, e o facto de vir das elites (não vinha, mas um preto casado com uma branca bonita sobe automaticamente de classe, é bem conhecido)].
O que mais me marcou, e para sempre, é que era completamente impossível explicar àquela gente - todos eles professores universitários, repare-se (na sua maioria de psicologia, psiquiatria, sociologia) - que nós não estávamos a defender o apartheid. Aquilo que dizíamos era, para eles, uma defesa encapotada do monstro; e tudo o que disséssemos era interpretado a essa luz. Porque não era um problema de vocabulário - era de epistomologia. Nós falávamos de política, e eles respondiam-nos com moral (não necessariamente que seja pior ou melhor. É simplesmente uma plano diferente. Se estivéssemos a falar de moral e eles nos respondessem com política o efeito seria o mesmo). E contra isso não há palavras que cheguem (nem num sentido nem no outro, note-se). Pode discutir-se uma situação política - ou climática, ou social, ou o que quer que seja - quando os dois interlocutores estão a falar da mesma coisa. Mas se eu falar em aquecimento global num modo, por exemplo, científico e o meu interlocutor me responder no modo religioso, ou social, ou político, é impossível continuar. Recentemente tive um debate sobre o aquecimento global com um blogger que terminou com ele a dizer-me que "nós (os cépticos) pensamos que na ciência, como na política, tem que haver uma posição contraditória, mas isso não é verdade". Isto não é ciência, é religião. Uma vez acolhi um casal de americanos na casa que partilhava com a minha namorada, em La Chaux-de-Fonds. Um dia o americano estava a falar não me lembro de quê - provavelmente atletismo - e disse que os pretos têm mais fibras musculares em cada músculo do que os brancos [não sei se é verdade se não. Não interessa]. A minha namorada (uma esquerdista menos zeitgeist do que o habitual e com olhos verdes lindos, e muitas sardas) ia fuzilando o homem porque ele estava a justificar não o facto de os pretos correrem mais depressa, mas sim a exploração à qual aquela pobre raça estava sujeita.
O tema toca-me, claro: já convivi com bastantes vítimas de costumes bárbaros e não me parece consensual que elas os apreciem cegamente. De uma forma geral é mesmo o oposto. Mas esses são, naturalmente, os "alienados", "aculturados", as elites. Enfim, do pior que há numa sociedade.
Já tive centenas - centenas - de discussões destas. Sobre a excisão, Israel, a democracia em África, o apartheid. Nunca mais: é impossível discutir (pelo menos quem, como eu, não é um intelectual), porque estamos em patamares epistomológicos diferentes. Podemos falar do mal com quem do mal tem uma opinião diferente da nossa. Mas não com quem não reconhece o mal (mal, bem - podem substituir por qualquer outro valor. Ou até cores: podemos debater se um encarnado é mais ou menos acastanhado; mas se onde nós vemos encarnado o nosso interlocutor vê azul, ou cinzento, nada há a discutir - a menos que se ande permanentemente com um espectómetro, o que não é o meu caso. E mesmo assim ainda pode haver desacordo quanto aos termos que designam um dado comprimento de onda).
Quando cheguei à Suíça caí num meio universitário, esquerdista daqueles a que eu chamava esquerda zeitgeist, às vezes e esquerda religiosa outras (quando os queria chatear um bocadinho) - a mesma que encontramos hoje a clamar contra o aquecimento global, Israel (esse é um tema perene, infelizmente) etc.. Discutia-se invariavelmente o apartheid. Eu dizia-lhes que o apartheid do qual eles estavam a falar não existia. Havia outro - que eu não aprovava, obviamente - mas que não era, de todo, aquilo de que eles estavam a falar.
Um dia convidei um sul-africano preto, um magnífico músico de jazz que morava em Genève e um branco, da uppercast, para um jantar em minha casa. Eles e os excitados (iam falar com um preto sul-africano pela primeira vez na vida) defensores dos direitos humanos, etc.. O choque daquela gente quando ouviu o Henry (era o músico) a dizer exactamente - palavra por palavra - o que eu lhes dizia é indescrítivel; corroborado pelo outro, o melhor skipper que jamais trabalhou para mim. Eles não percebiam: como é que um preto, sul-africano, músico (artista!, e bom, ainda por cima) casado com uma loira sublime e inteligentíssima podia dizer coisas daquelas? Que um branco das classes superiores dissesse, compreendia-se. Mas um preto? Era o desabar de um mundo - e a melhor maneira de lutar contra isso é, então como hoje, pura e simplesmente ignorar - no sentido primeiro do termo, como um cego de nascença ignora o encarnado - os argumentos do outro. [E, claro, mencionar a aculturação dele, a sua tremenda alienação, e o facto de vir das elites (não vinha, mas um preto casado com uma branca bonita sobe automaticamente de classe, é bem conhecido)].
O que mais me marcou, e para sempre, é que era completamente impossível explicar àquela gente - todos eles professores universitários, repare-se (na sua maioria de psicologia, psiquiatria, sociologia) - que nós não estávamos a defender o apartheid. Aquilo que dizíamos era, para eles, uma defesa encapotada do monstro; e tudo o que disséssemos era interpretado a essa luz. Porque não era um problema de vocabulário - era de epistomologia. Nós falávamos de política, e eles respondiam-nos com moral (não necessariamente que seja pior ou melhor. É simplesmente uma plano diferente. Se estivéssemos a falar de moral e eles nos respondessem com política o efeito seria o mesmo). E contra isso não há palavras que cheguem (nem num sentido nem no outro, note-se). Pode discutir-se uma situação política - ou climática, ou social, ou o que quer que seja - quando os dois interlocutores estão a falar da mesma coisa. Mas se eu falar em aquecimento global num modo, por exemplo, científico e o meu interlocutor me responder no modo religioso, ou social, ou político, é impossível continuar. Recentemente tive um debate sobre o aquecimento global com um blogger que terminou com ele a dizer-me que "nós (os cépticos) pensamos que na ciência, como na política, tem que haver uma posição contraditória, mas isso não é verdade". Isto não é ciência, é religião. Uma vez acolhi um casal de americanos na casa que partilhava com a minha namorada, em La Chaux-de-Fonds. Um dia o americano estava a falar não me lembro de quê - provavelmente atletismo - e disse que os pretos têm mais fibras musculares em cada músculo do que os brancos [não sei se é verdade se não. Não interessa]. A minha namorada (uma esquerdista menos zeitgeist do que o habitual e com olhos verdes lindos, e muitas sardas) ia fuzilando o homem porque ele estava a justificar não o facto de os pretos correrem mais depressa, mas sim a exploração à qual aquela pobre raça estava sujeita.
O tema toca-me, claro: já convivi com bastantes vítimas de costumes bárbaros e não me parece consensual que elas os apreciem cegamente. De uma forma geral é mesmo o oposto. Mas esses são, naturalmente, os "alienados", "aculturados", as elites. Enfim, do pior que há numa sociedade.
São, de facto, discussões inúteis, que nem o simples prazer de discutir dão. Ouvi, em tempos, a tese de que, nestes casos, os opositores argumentam com diferentes hemisférios cerebrais, pelo que os seus raciocínios seguem trajectos distintos, em planos paralelos, sem hipótese de alguma vez se cruzarem. É possível que haja um fundo de verdade na tese, se, por exemplo, a sede do raciocínio político (ou da percepção do que é) está no hemisfério direito e a do raciocínio moral (ou da consideração do que deve ser) está no esquerdo. A mim, parece-me, sobretudo, avisado não falar do que não sei (embora o faça com muita frequência, só para lançar a confusão). ;-)
ResponderEliminarMuitíssimo bem exposta a forma, como de costume. Mas não conhecemos o conteúdo da tese, Luís. Ou seja, concordo inteiramente com o facto de ser inútil e cansativo discutir com quem nem sequer reconhece as nossas premissas, mas continuo sem saber quais são as suas e as do tal sul-africano, sobre o apartheid. Pelo que não sei se vos dou ou não razão, tenha eu ou não conhecimentos profundos sobre o assunto. Sobre a legitimidade da excisão (ou de qualquer outra forma de mutilação ou tortura) nem sequer admito discussão, de onde deduzo que faço parte dos tais "aculturados", pelo menos neste caso. Mas, para mim, o plano moral sobrepõe-se sempre ao político (será que com esta declaração me mudo para o outro grupo?). Resumindo, talvez me falte um hemisfério... :-)
ResponderEliminarConcordo com a Ana V. na parte de não conhecer a sua tese, Luís. Seria interessante um dia fazê-lo, se lhe apetecer.
ResponderEliminarÉ que já fui mais extremista nestas coisas e apesar de ter uma opinião sobre cada um dos temas, sei que "temos" (ocidentais) a enorme tendência de simplificar excessivamente as coisas.
Miguel
Caros Ana e Miguel,
ResponderEliminarpara io tema do post, pouco importa quais as teses que cada um de nós defendia. Mas enfim, de uma forma muito sintética: para os nossos amigos suíços de esquerda (parece uma contradição nos termos, mas não é: Genève tem uma Câmara Municipal de extrema-esquerda há trinta anos. É sistematicamente eleita porque a cada eleição promete que vai dificultar ainda mais o tráfego automóvel na cidade. E cumpre, claro) o apartheid era uma espécie de luta de classes doublée de luta de raças. de um lado havia os brancos, todos ricos; do outro os pretos, todos pobres (eles não acreditavam sequer, por exemplo, que havia uma classe média negra - e muito menos negros ricos, claro).
Quando nós lhes explicávamos que
a) havia duas "tribos" brancas (os boers e os "ingleses", anglos para os íntimos, uma das quais era a favor e a outra contra o apartheid;
b) havia pelo menos onze grandes grupos (etnias, para quem prefere, se bem não seja inteiramente exacto) negras, e que dessas duas apoiavam o apartheid (os Zulus - da qual fazia parte o Henry) e uma outra cujo nome não recordo;
c) havia, dentro de cada uma dessas "tribos", ricos, pobres e remediados, e que as posições em relação ao apartheid eram transversais (isto é, variavam menos com a classe social do que com a origem étnica);
d) a luta contra o apartheid há muito deixara de ser racial, e agora era política: era uma luta contra o comunismo (menos de dois anos depois da queda do Murio de Berlim Mandela foi libertado. Just in case);
Muito sinteticamente, era isto.
Quanto à legitimidade da mutilação genital feminina, Ana: não é isso que está em causa, no debate; e a posição de C. Mattos, de quem eu discordo, é pertinente. Mas para isso era preciso ler aquela tralha toda...
Ainda não li o debate, Luís, só há poucas horas tive net e o trabalho estava primeiro. A minha reacção ao tema "excisão" é emotiva e genérica, não se refere ao debate.
ResponderEliminarSobre o apartheid, obrigada pela clarificação. Tanto quanto sei, os Zulus são uma espécie de aristocracia das etnias negras da África do Sul, e não deixa de ser curioso ver como a sobranceria é comum às "classes altas", tenham elas a cor que tiverem. Acredito que a luta se tenha tornado meramente política com o tempo, e que a questão racial fosse fazendo cada vez menos sentido, mas não podemos esquecer-nos do significado da palavra e do que deu origem a essa designação. A divisão dizia respeito à cor da pele, não à cor política...
Ana,
ResponderEliminarO apartheid, na sua primeira, última e intermédia formas era uma negação do outro; e como tal é indefensável de per si, seja ele de origem racial, política, seja ele inspirado por uma luta anticomunista ou anti seja o que for.
Mas há duas vantagens em conhecer bem um fenómeno que se quer combater: a primeira é que é evidentemente mais fácil escolher as armas - sejam elas armas a sério, argumentos, acções políticas - necessárias; a segunda é que nos permite melhor evitar o seu ressurgimento.
Querer atacar o apartheid, a mutilação genital feminina, a utilização de crianças na guerra (ou de civis, como faz o Hamas, já agora) utilizando como estratégia os discursos morais é inútil, é uma perda de tempo, e - sobretudo - não evita que a mesma coisa se reproduza noutro lugar e noutro tempo.
A indignação deve ser, se quiser, um ponto de partida, mas não deve ser o caminho - e muito menos o veículo.
Já aqui devo ter falado, várias vezes, nos "missionários" (não confundir com os verdadeiros, desculpe-me a repetição) que andavam pelo Burundi e pelo Rwanda e que, deixados à solta (como estão, infeliz e frequentemente, noutros contextos) resolvem um problema e criam outros dez logo a seguir.
Eu não ponho emn causa, repare, a boa vontade dos meninos e meninas; nem a sinceridade, o empenho, tudo. O que digo - e isto é irrefutável, comprovável e muitas vezes quantificável - é que eles fazem pior do que se estivessem quietos em casa a receber o subsídio de desemprego e a ver televisão.
Atente, por exemplo, no caso da ONG italiana de que falo no Jugular: leia aquilo, pense dois minutos e diga-me a que conclusão chegou.
PS - além de que é perigoso, ou pelo menos delicado ir mexer nas origens do apartheid: segundo vários autores ele nasceu porque os boers, que sempre respeitaram um inimigo (aliás como os ingleses), queriam que cada entidade se desenvolvesse à sua maneira. Como o desenvolvimento económico era bastante assimétrico - e porque isso dava jeito aos boers (e aos ingleses), as assimetrias económicas rapidamente se transformaram noutras assimetrias.
ResponderEliminarMas a ideia base até - talvez - nem fosse assim tão má.
Eu não tenho opinião sobre isto: não li suficientemente os teóricos originais para formar uma opinião consistente. (Como pode imaginar, esta tese era violentamente contestada por quem se opunha ao apartheid. O que é estúpido, e irrelevante: todos nós conhecemos boas ideias que descambam).
Luís,
ResponderEliminarObrigado pela explicação.
Pensava que se referia a outra coisa.
A minha passagem por africa fez me ver as coisas de maneira muito diferente. Nomeadamente questionar a nossa mania de impor os nossos modelos a outras culturas.
Miguel
Miguel,
ResponderEliminara nossa "mania", como lhe chama, de impôr os nossos modelos a outras culturas não é, reconhecê-lo-á provavelmente, sempre má.
Se, por exemplo, estivermos a falar do nosso modelo de mutilação genital feminina; do nosso modelo de crianças-soldados; do nosso modelo de igualdade de géneros; do nosso modelo de assistência social; ou... enfim, a lista é longa.
O problema está mais na maneira como se impõem os modelos do que propriamente no facto de o fazer.
Repare, aliás, que esses modelos não devem ser completamente desagradáveis para os membros de outras culturas: se são, como explicar os afluxos de imigrantes - que arriscam o mais das vezes a vida - para vir "sofrer" as terríveis consequências destes tão abomináveis modelos?
Claro que a imposição destes modelos é muitas vezes criticada em África, e noutros continentes - por aqueles que têm a perder com eles.
Mas isso é outra história.
Um abraço.
O que me traz à memória, Ana, que um outro argumento que nós, no tal grupo, utilizávamos e que era negado: o irrefutável e quantificável faccto de haver inúmeros negros de outros países a emigrar para a África do Sul do apartheid.
ResponderEliminarMas enfim, é debate anacrónico, no mínimo. Felizmente.
Caro Luís,
ResponderEliminarEstamos básicamente de acordo.
A questão é que discordo com impor (enfase no impor)o que quer que seja a culturas diferentes da nossa e em países diferentes dos nossos que têm tanto direito à diferença como nós.
Óbviamente que há coisas noutras culturas que nos chocam. Algumas serão mesmo inadmissíveis aos nossos olhos. Muitas o são para mim. Mas o Inverso também se aplica.
Acredito que com o tempo, a globalização e a troca de Informação haverá uma tendência natural para certos hábitos desaparecerem (bons e maus... aos nossos olhos).
O que me refiro essencialmente consiste no facto de muitas vezes nos esquecermos que aos olhos dessas culturas, esses "hábitos" desumanos são perfeitamente normais e até desejáveis.
Não consigo levar a mal que uma pessoa nascida em África do Sul com uma educação racista o seja. Fez parte da sua educação.
Considero que o único direito (ou dever) que temos é o de questionar, discutir, tentar perceber e mostrar maneiras diferentes de viver. Mas isso é um "trabalho" de gerações. Aceito contributos para ajudar a mudar uma cultura. Mas terá que ser sempre uma opção dessa mesma cultura. Nunca uma imposição. A mudança para fazer sentido tem que partir de dentro. Isto aplica-se a países em que o sistema político ainda é o religioso ou países governados por ditadores, por exemplo. O Iraque foi um exemplo claro disso... Presumimos que não queriam um ditador. Forçamos a uma democracia que de momento é virtualmente impossível.
Assim, quando digo impor modelos a outros, refiro-me essencialmente à mania que temos em simplificar em excesso as coisas, neste caso as outras culturas. Ter a pretensão que basta mudar um ou dois aspectos da cultura para as coisas serem aceitáveis. Temos feito frequentemente isso e raramente tem dado bom resultado.
Nós, portugueses, sofremos igualmente com isso. Por vezes tentamos impor modelos nórdicos à nossa cultura sem nos apercebermos que a mesma e a sociedade ainda não estão preparadas para essa mudança. Que há um trabalho de fundo a fazer.
Do mesmo modo, há países (culturas) que ainda não estão preparados para a Democracia, para a Igualdade de direitos, etc.
Isso infelizmente leva tempo.
A questão de receber pessoas de culturas diferentes, é outra questão. Serão pessoas que terão (ou deveriam) adaptar-se à nossa cultura e, consequentemente tornam-se potenciais agentes de mudança das suas próprias culturas. Se, comparando-as assim o considerem justificável. Eventualmente e idealmente mantendo o melhor de cada uma delas.
Entretanto já me perdi por estas linhas e ideias...
Adiante. Este assunto não tem fim.
Miguel