12.9.09

Pertença

Aos sábados compro o Expresso e o Público; vou ao mercado biológico comprar metade de meia-dúzia de coisas que levarei uma semana a consumir; bebo um café na Esplanada. Ou então vou comer um brunch ao café da Praça, um bocadinho mais abaixo. Digo, como todos os dias, à jovem toxicómana "não". Digo-o delicadamente, com um sorriso; ela também sorri para mim. É - ou podia ser - bonita e tem uma expressão inteligente no olhar (às tardes começa a ficar triste e fechado, mas nunca perde o ar inteligente). O jardim é lindo e está cheio de crianças com cães e pais que também foram às compras. Conheço-o de cor. Por baixo há um reservatório de água onde uma vez dei um primeiro e quase último beijo; muitas vezes sento-me à sombra de uma das suas árvores.

Levo as compras no cesto da bicicleta, ou num dos que me sobraram dos muitos que trouxe de África. Aquele de que gosto mais é grande, redondo, lindo e atrai o olhar das pessoas como atraiu o meu. Alguns dos vendedores já me conhecem, como os empregados do café onde todos os dias começo o dia. A caminho do escritório o polícia sinaleiro arranja sempre maneira de não me fazer parar - "para não perder a embalagem" - beneficiando assim, de passagem, o trânsito que vai no mesmo sentido. Quando não consegue, seja porque não me viu ou porque as bichas do outro lado se estão a avolumar, pede desculpa.

A senhora da farmácia não me conhece - é raro entrar lá; mas os vendedores de jornais das redondezas, os cafés e restaurantes conhecem-me todos. Digo-lhes "bom dia" com um aceno de cabeça e um insondável espanto: pertenço finalmente a um lugar.

1 comentário:

  1. Peço desculpa, mas essas manhãs de sábado, pertencem-me a mim também.
    Só que eu, está visto, digo sempre que sim à jovem toxicómana e aos outros toxicómonos todos, por isso a coisa torna-se dispendiosa

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.