O Jornal de Negócios de hoje traz um artigo muito interessante de um senhor chamado João Bernardo Soares, Partner da Bain & Company. O título é "Ask not what your country can do for you..." e está dividido em duas partes. Na primeira o autor faz uma descrição do declínio de Portugal relativamente aos outros países europeus:
- Somos o segundo país mais pobre da zona Euro em termos de PIB per capita e em 2010 seremos o mais pobre, pois previsivelmente a Eslovénia, que fez o favor de nos tirar dessa situação em 2009 (quando aderiu ao Euro), vai ultrapassar-nos;
- A Grécia, com quem durante muito tempo nos comparámos e disputávamos os últimos lugares das tabelas, tem neste momento um PIB per capita 44% superior ao português;
- O PIB per capita português passou de 71.6% da média da zona euro para 66,6% (e de 80,8% para 72,3% se em vez de nos referirmos à zona euro nos referirmos à média europeia);
- Em finais de 2008, o valor das empresas portuguesas com mais de 500 milhões de euros de facturação representava 8% do valor total das empresas ibéricas;
Esta primeira parte conclui dizendo que as perspectivas não são animadoras, e que o nosso défice externo vai estabilizar provavelmente acima dos 10%.
A segunda parte do artigo propõe 4 acções "aos nossos gestores, reconhecidos como muito capazes mas que não têm conseguido mudar o rumo macro da Nação" (daí a menção ao célebre discurso de Kennedy).
Qualquer pessoa que tenha vivido mais de seis meses num qualquer país europeu desenvolvido sabe que os portugueses não são diferentes dos outros; aos mesmo estímulos reagimos de formas semelhantes: se nos derem um espaço para andar a pé andamos, se nos multarem por não pararmos nas passadeiras paramos, etc. Não somos nem mais preguiçosos, nem mais incompetentes, nem menos inteligentes do que qualquer outro povo. A explicação para o "estado a que isto chegou" deve procurar-se noutro lado.
Para começar: haverá "estado a que isto chegou"? A resposta é não, claro: sempre (ou pelo menos há muito tempo) fomos os últimos da Europa, e vamos continuar a sê-lo - a diferença é que a "Europa" agora tem mais países, e os nossos referenciais vão ser outros; não me parece uma mudança significativa. Sempre tivemos empresas "pequenas" - salvo poucas honrosas excepções, preferimos ser os maiores do quintal a ser qualquer coisa fora dele. E sempre tivemos gestores, políticos e decisores de reconhecida qualidade. A situação que o autor do artigo descreve não é, portanto, muito diferente da que sempre foi. Pelo menos em termos relativos. Em termos absolutos é evidente, inegável, que estamos hoje melhor do que há 30 anos.
As questões são saber a) porquê, e b) se há remédio.
Começo pela b): não. Já pensei que sim, depois que não, depois que sim outra vez, mas agora penso, estou convicto, tenho a certeza de que não há remédio, e continuaremos a ser os últimos do euro, da Europa, e em breve da OCDE, ou de seja qual for o clube onde nos queiramos integrar. A resposta é "não" não por defeitos próprios, individuais, mas por causa por um lado da forma como nos organizamos colectivamente, e por outro da nossa resposta a essa organização.
Os nossos "gestores reconhecidos como muito capazes" vivem optimamente, em Portugal. Os nossos decisores políticos também (e não mencionem os salários baixos: os benefícios não-financeiros também contam; para além dos que vão auferir quando "deixarem a política" - entre aspas porque não a deixarão, nunca: apenas mudarão de empregador). E quem não está contente e é ambicioso emigra.
Ou seja: a população de Portugal é constituída na sua maioria por pessoas que ou beneficiam (ou pelo menos não sofrem) com a situação ou não lhe exigem mudanças drásticas. Às primeiras, apenas se pede que nos mantenham no clube; não interessa em que lugar. As segundas não estão dispostas a fazer os sacrifícios que sair do último lugar requer - e quando estão, não o fazem em Portugal porque concluíram, acertadamente, que não vale a pena.
Não tem nada a ver com as nossas "qualidades" ou "defeitos", nem com as nossas capacidades ou competências. Os gestores das grandes empresas portuguesas estão roucos de saber o que fazer - e fazem-no, quando vão trabalhar para empresas internacionais. Não têm é razões para o fazer em Portugal. Os gestores, seja em Portugal, na Alemanha ou na Lua são pagos para gerir empresas e gerar lucros para os seus accionistas, e não para "mudar o rumo macro do país". Quem é pago para fazer isso são os políticos. Ora acontece que quem lhes paga ou está contente ou se vai embora.
Os estímulos para mudar são poucos, em ambos os casos - sobretudo quando têm níveis de vida semelhantes aos de qualquer colega "europeu" - ou melhor, até (uma comparação de salários e benefícios extra-salariais das nossas classes políticas, começando nos vereadores das câmaras municipais e respectivos assessores seria elucidativa).
As "quatro acções" de João Bernardo Soares são interessantíssimas - mas têm tantas probabilidades de ser postas em prática (pelo menos de uma forma significativa) como de ser um protestante eleito Papa. Porque elas destinam-se a gerar capital que depois iria para o PIB e daí para as capita. Infelizmente não é esse o capital mais importante em Portugal.
Mais: em muitos casos, alterar o status quo implicaria, para muitas das pessoas dos grupos dirigentes (políticos, gestores, quadros superiores), uma perda de privilégios, poder, dinheiro - em termos absolutos ou em relação ao resto da população. E vê-se mal um grupo social, seja ele de que nacionalidade for tomar decisões que impliquem uma, ou várias, dessas consequências.
- Somos o segundo país mais pobre da zona Euro em termos de PIB per capita e em 2010 seremos o mais pobre, pois previsivelmente a Eslovénia, que fez o favor de nos tirar dessa situação em 2009 (quando aderiu ao Euro), vai ultrapassar-nos;
- A Grécia, com quem durante muito tempo nos comparámos e disputávamos os últimos lugares das tabelas, tem neste momento um PIB per capita 44% superior ao português;
- O PIB per capita português passou de 71.6% da média da zona euro para 66,6% (e de 80,8% para 72,3% se em vez de nos referirmos à zona euro nos referirmos à média europeia);
- Em finais de 2008, o valor das empresas portuguesas com mais de 500 milhões de euros de facturação representava 8% do valor total das empresas ibéricas;
Esta primeira parte conclui dizendo que as perspectivas não são animadoras, e que o nosso défice externo vai estabilizar provavelmente acima dos 10%.
A segunda parte do artigo propõe 4 acções "aos nossos gestores, reconhecidos como muito capazes mas que não têm conseguido mudar o rumo macro da Nação" (daí a menção ao célebre discurso de Kennedy).
Qualquer pessoa que tenha vivido mais de seis meses num qualquer país europeu desenvolvido sabe que os portugueses não são diferentes dos outros; aos mesmo estímulos reagimos de formas semelhantes: se nos derem um espaço para andar a pé andamos, se nos multarem por não pararmos nas passadeiras paramos, etc. Não somos nem mais preguiçosos, nem mais incompetentes, nem menos inteligentes do que qualquer outro povo. A explicação para o "estado a que isto chegou" deve procurar-se noutro lado.
Para começar: haverá "estado a que isto chegou"? A resposta é não, claro: sempre (ou pelo menos há muito tempo) fomos os últimos da Europa, e vamos continuar a sê-lo - a diferença é que a "Europa" agora tem mais países, e os nossos referenciais vão ser outros; não me parece uma mudança significativa. Sempre tivemos empresas "pequenas" - salvo poucas honrosas excepções, preferimos ser os maiores do quintal a ser qualquer coisa fora dele. E sempre tivemos gestores, políticos e decisores de reconhecida qualidade. A situação que o autor do artigo descreve não é, portanto, muito diferente da que sempre foi. Pelo menos em termos relativos. Em termos absolutos é evidente, inegável, que estamos hoje melhor do que há 30 anos.
As questões são saber a) porquê, e b) se há remédio.
Começo pela b): não. Já pensei que sim, depois que não, depois que sim outra vez, mas agora penso, estou convicto, tenho a certeza de que não há remédio, e continuaremos a ser os últimos do euro, da Europa, e em breve da OCDE, ou de seja qual for o clube onde nos queiramos integrar. A resposta é "não" não por defeitos próprios, individuais, mas por causa por um lado da forma como nos organizamos colectivamente, e por outro da nossa resposta a essa organização.
Os nossos "gestores reconhecidos como muito capazes" vivem optimamente, em Portugal. Os nossos decisores políticos também (e não mencionem os salários baixos: os benefícios não-financeiros também contam; para além dos que vão auferir quando "deixarem a política" - entre aspas porque não a deixarão, nunca: apenas mudarão de empregador). E quem não está contente e é ambicioso emigra.
Ou seja: a população de Portugal é constituída na sua maioria por pessoas que ou beneficiam (ou pelo menos não sofrem) com a situação ou não lhe exigem mudanças drásticas. Às primeiras, apenas se pede que nos mantenham no clube; não interessa em que lugar. As segundas não estão dispostas a fazer os sacrifícios que sair do último lugar requer - e quando estão, não o fazem em Portugal porque concluíram, acertadamente, que não vale a pena.
Não tem nada a ver com as nossas "qualidades" ou "defeitos", nem com as nossas capacidades ou competências. Os gestores das grandes empresas portuguesas estão roucos de saber o que fazer - e fazem-no, quando vão trabalhar para empresas internacionais. Não têm é razões para o fazer em Portugal. Os gestores, seja em Portugal, na Alemanha ou na Lua são pagos para gerir empresas e gerar lucros para os seus accionistas, e não para "mudar o rumo macro do país". Quem é pago para fazer isso são os políticos. Ora acontece que quem lhes paga ou está contente ou se vai embora.
Os estímulos para mudar são poucos, em ambos os casos - sobretudo quando têm níveis de vida semelhantes aos de qualquer colega "europeu" - ou melhor, até (uma comparação de salários e benefícios extra-salariais das nossas classes políticas, começando nos vereadores das câmaras municipais e respectivos assessores seria elucidativa).
As "quatro acções" de João Bernardo Soares são interessantíssimas - mas têm tantas probabilidades de ser postas em prática (pelo menos de uma forma significativa) como de ser um protestante eleito Papa. Porque elas destinam-se a gerar capital que depois iria para o PIB e daí para as capita. Infelizmente não é esse o capital mais importante em Portugal.
Mais: em muitos casos, alterar o status quo implicaria, para muitas das pessoas dos grupos dirigentes (políticos, gestores, quadros superiores), uma perda de privilégios, poder, dinheiro - em termos absolutos ou em relação ao resto da população. E vê-se mal um grupo social, seja ele de que nacionalidade for tomar decisões que impliquem uma, ou várias, dessas consequências.
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