31.3.11

Livro de bordos - 12 (Notas)

I
Seria preciso começar por explicar o que e como são as Tobago Cays: um conjunto de ilhotas desabitadas e recifes protegido dos alízeos por dois recifes grandes: o World's End Reef - o que está por fora de tudo - e o Horseshoe Reef. A maioria das embarcações vai para o interior do Horseshoe, fundear entre as ilhas de Baradal e Jamesby. Desta vez vim para Petit Tabac, uma ilhota que fica entre os dois recifes. Somos o únco barco, pois o fundeadouro rola um bocadinho e porque as pessoas gostam de estar em manada.

A lua nasceu tarde, já devia passar da meia-noite. Até lá a escuridão era total: ao longe as luzes de Clifton, a sul; de Canouan, a norte; e entre as duas as luzes de fundeadouro dos barcos que estavam dentro do Horseshoe Reef. Eu vim para fora, para Petit Tabac. Somos o único barco, numa laguna rodeada de recifes.

Quando a lua apareceu era um niquinho de luz, uma unha que alguém esqueceu de cortar; mas chegava para iluminar a praia, da qual estávamos a menos de cem metros. Não se via nada, mas ouvia-se perfeitamente o mar a quebrar no recife de um lado e na praia, de outro. De repente a luz era suficiente para distinguir a rebentação e dar um corpo apaziguador àqueles barulhos, dos quais qualquer marinheiro desconfia.

A noite estava de tal forma escura que as estrelas apareciam em três D.

Entrei à vela; o passe não é muito difícil, mas dá gozo. Pensei em duas ou três pessoas que gostaria de ter aqui comigo; é chato fazer isto com gente que nos diz pouco ou a quem isto pouco diz.

Mas é melhor fazer isto do que fazer outra coisa qualquer.

II
Continua a chocar-me ver pessoas a jogar às cartas, ou a um jogo de sociedade qualquer, quando passamos por paisagens que a mim, que por elas passo todas as semanas, me comovem sempre e não cansam nunca, de tão lindas.

III
À chegada a Rodey Bay vimos baleias. Duas, mãe e filho. É outro espectáculo do qual não me canso - se bem nunca deixe de estar apreensivo, com a história do George.

(Já aqui a contei: o George era o skipper do GUIA, um desses clássicos italianos que ainda hoje me faz chorar, quando penso nele. Uma noite em pleno Atlântico uma baleia afundou-ou, clara e propositadamente. Uma porrada na quilha que a fez subir dois metros; em cinco minutos o barco afundou-se. Felizmente a tripulação foi reolhida menos de 24 horas depois.

Encontrei o George nos Açores. Teve um ataque de coração e levei-o ao hospital da Horta, depois de passar uns dias connosco).

Toco na madeira - já estive pertíssimo de dezenas de baleias e nunca nenhuma se lembrou de me subir a quilha. Inch'Allah.

A mãe era enorme. Numa das vezes que veio à superfície parecia um submarino. Mas o sopro era baixo. Não sei de que espécie eram - provavelmente baleias de bossa, mas não tenho a certeza.

IV
Rodney Bay é uma escala civilizada. A civilização é bom - caro, mas bom.

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