5.10.13

Diário de Bordos - Bocas del Toro, Panamá, 05-10-2013

O primeiro plano é feito de verticais: as colunas do café onde estou e as do do lado, as da doca do Jampan, a empresa que me leva e traz de Red Frog quando não há barco gratuito da marina. O segundo é uma mistura de cores sem direcção definida: o telhado amarelo triangular, chapéus de sol, o bimini top azul de uma panga que o sol do meio dia ilumina quase à fosforecência, o telhado azul turquesa da loja de ferragens.

Também há curvas: no terraço do centro de mergulho onde M. faz o curso de Dive Master está uma senhora em biquini, de pé, a beber qualquer coisa por uma lata; ao meu lado, na mesa onde hoje de manhã estavam cinco jovens miúdas provavelmente inglesas estão agora dois ligeiramente menos jovens casais alemães cujas componentes feminininas são, ma parole, bastante apreciáveis. Não desfazendo, claro.

Até o maricas efeminado, tantouze que frequenta o Lily's contribui para as curvas da paisagem, de tanto se requebra a andar.

Estudo atentamente o segundo plano, o das cores e formas díspares; descubro mais telhados, apercebo-me do movimento das plantas que um dos hotéis tem em grandes vasos no terraço (são palmeiras pequenas). Todas as construções estão sobre palafitas na água, transparente apesar da quantidade de embarcações que a cruza permanentemente e cria uma ondulação caótica, desordenada.

Todas as manhãs vou a Bocas, todas as manhãs me sento num destes cafés e todas as manhãs tenho uma vista diferente: seja por causa da luz, seja porque não olho para as mesmas coisas.

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Hoje tivemos o nosso primeiro toque: dez pessoas procuram um barco de luxo, com ar condicionado, para ir pescar. Entre o HELENA S. e o luxo há um abismo; de material de pesca nem se fala. Mas é possível que os senhores baixem as expectativas um bocadinho, ligeiramente, como passar de uma penthouse na Quinta Avenida para uma cave em Harlem. Enfim, exagero. O meu HELENA S. não é uma cave em Harlem. Só precisa de uma pintura, vigias novas, refazer a electricidade, pressurizar a água e mais meia dúzia de pormenores assim. Se eles vierem vão gostar.

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Ontem fui à praia de Red Frog, pela primeira vez sozinho. Já lá tinha ido mas com a equipa de ouro, N., D., M. Lembrei-me de Pigeon Beach, dos horrorosos dias que lá passei; da alegria efémera que foi descobrir Windward Beach - o sofrimento reapareceu muito depressa, logo a seguir à alegria inicial -.

Gostei de estar na praia. Mas continuo a não gostar da areia e muito rapidamente me refugiei no Palmar com uma garrafa de vinho branco. Vemos o que somos, vemos o que estamos. E hoje gostar mais de Bocas do que gostava quando cá cheguei, ou preparar-me para ir de novo à praia pouco têm a ver com Bocas ou com a praia.

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