10.4.15

Diário de Bordos - S. Luis, Maranhão, Brasil, 10-04-2015

"Quando olhamos para uma pessoa só vemos metade dela". ("E muitas vezes a melhor metade", acrescenta R., um dos meus grandes amigos ludovicenses).

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A rua está deserta. A Tia Dica e o Raimundo preparam-se para a noite. As pessoas que vejo estão-me na memória ou na imaginação.

Como seria hoje o provérbio chinês? Quando nos correspondemos com uma pessoa só lhe conhecemos a metade? Que acrescentaria R. - a pior metade? A mais brutal e directa, sem a mediação das boas maneiras que a proximidade física impõe?

"Gosto de ti"; "Interessas-me"; "Não fazes o meu género"... Quanto tempo levaríamos a dizer isto  se em vez de um teclado e um monitor tivéssemos entre nós uma mesa e dois copos? E já agora - porque assumimos imediatamente que um encontro facebookiano tem como objectivo imediato um relacionamento, ou pelo menos o sexo -?

Não sei. Pouco me interessa, na verdade. As pessoas nos computadores não são fundamentalmente diferentes das pessoas atrás de um volante ou do outro lado de uma mesa. Se são merda é a mesma, mas mais directa; se não, são melhores, porque o vemos mais rapidamente.

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Há mulheres que sabem distinguir entre um flirt a sério, com objectivos e um flirt sem eles - ou melhor, cujo objectivo é ele mesmo. Um flirt em si (são os melhores. Os outros acabam frequentemente em dó).

"As-tu des intentions cachées?", perguntaram-me uma vez. "Non. Mes intentions sont bien visibles". A senhora não percebeu que eu me referia ao magnífico par de mamas que o decote expunha generosa e um bocadinho provocadoramente.

Lenny sabe que o meu flirt com ela não tem outro objectivo, outra intenção escondida ou visível se não ele mesmo. Provoca-me e diverte-se com as minhas respostas.  É por isso que gosto de vir à Tia Amélia. Ela sabe que as mamas são para vender cerveja e inspirar humor. E sabe que eu sei. Uma cumplicidade gambrínico-mamária não pode dar errada.

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É sexta-feira e o Mercado das Tulhas está a abarrotar. O barulho parece, como sempre, um cilindro compressor, daqueles que se usam para fazer estradas.

Lenny passeia as mamas e o sorriso - os sorrisos. Variam de cliente para cliente - por esta multidão com o porte de uma raínha. É uma raínha.

E eu fundo-me neste magma primordial, nesta sopa vital como se a Lenny fosse uma raínha e eu o Rei.

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