O local não é adequado. Eu sei: não há locais adequados. A vida passa-se sempre ao lado, Na porta ao lado, na cidade ao lado, no país vizinho, no continente do outro lado da poça.
Um dia apanhei um avião para Milão. Foi há muitos anos. Tinha acabado de sair de uma discoteca em Cascais. Em contrapartida nunca fui a Bamako. E quero ir, Deus sabe se quero. Tivesse Bamako mar e já lá teria estado pelo menos vinte vezes. Ou mais.
N'importe quoi. Quantos sítios há no mundo que têm mar e aos quais quero ir e onde nunca pus os pés? Milhares. Tantos como os corpos idem: quero ir, têm mar e nunca fui (nem com os pés).
Não há lugares. Há vidas, pedaços de vida, bocadinhos pequenos, tranches, se quisermos ser irónicos. Eu quero. Um lugar é uma vida e as fatias de vida bem se podem ir foder. Quero ir a Bamako ver a estação de caminhos de ferro onde Salif Keita e Mori Kanté começaram. Quero ir a Bamako - não o digam a ninguém, por favor - porque não tem mar e tem música.
Não se pense que estou a habituar-me à ausência de mar: não existe tal coisa. O mar ausente é mar; ausente, mas mar. É como o amor, um corpo, um olhar: não estão, mas são.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.