"Tenho de começar a pôr ordem no meu passado" dizia o macaco. O problema sendo que cada vez que olhava para trás as árvores organizavam-se em florestas e perdia a noção.
Isto é.
Perdia a noção de cada uma. Podia, claro, pensar em termos de florestas e não de árvores. Ou pelo menos começar pelas florestas.
"Isso seria como pentear humanos", concluía. Era um macaco irónico.
As árvores tinham os ramos e as folhas embrenhadas uns nos outros como cabelos. Era um macaco dado a associações de ideias. Começava no passado e acabava nos cabelos loiros do presente. As florestas adquiriram os olhos azuis dos cabelos em questão e a vontade de pôr ordem no passado era imediatamente substituída pela de desordenar os ditos cabelos, se possível numa cama.
Da qual cama voltava ao passado, apressado. No cimo das florestas as folhas adquiriam o tom dourado do desejo, a languidez própria do desejo satisfeito.
"Sou por natureza insatisfeito. A satisfação repele-me. Gosto do desejo e do que ele me dá, mas não consigo dar-lhe a lentidão que ele me pede".
Era um macaco estúpido.
"Vistas do espaço as minhas florestas desaparecem".
Voltava, porém, ao desejo como o pára-quedista volta à terra: com uma mistura de alívio e tristeza. "O desejo é uma floresta impenetrável". Gostava de jogos de palavras.
Por vezes voltava atrás e numa dessas vezes apercebeu-se de que.
A distância entre ele e as florestas do seu passado era sempre a mesma. Como se as trouxesse a reboque. Verdade que as florestas cresciam - de cada vez que pensava nelas tinham mais árvores - mas estavam sempre todas elas à mesma distância dele. Não desapareciam.
Ou seja.
Temos um macaco lúbrico, não muito inteligente, lunático, com uma certa apetência para os jogos de palavras e para um par de olhos azuis.
Temos um passado desorganizado, caótico, que não foge às leis da gravidade (são duas: 1- tudo o que sobe tem de descer e 2- desce à mesma velocidade a que subiu. Isto é: chega à terra à mesma velocidade a que a largou) mas anda continuamente a testá-las.
E temos uma certa vontade de os fazer interagir. (Alguns diriam "necessidade" em vez de "vontade").
Há uma palette cromática: as árvores têm cores diferentes, tal como os seios das senhoras são seios e diferentes ou os cabelos ou tudo. "Ou até mesmo os desejos: todos iguais e não há dois iguais", pensou o macaco.
As florestas são habitadas e isso torna ainda mais difícil separá-las, classificá-las e ordená-las. De qualquer forma seria preciso começar por encontrar uma metodologia, uma colecção de critérios: a ter lugar a ordenação seria geográfica, cronológica, temática?
Enquanto isto tudo.
O sol e o vento divertem-se e mudam a cor das folhas. Variação ligeira, ora mais brilhante ora menos, ora mais para o verde e logo azul. Azul. Talvez o macaco devesse começar pelas cores. Seria mais fácil.
Como os livros para crianças.
Isto é.
Perdia a noção de cada uma. Podia, claro, pensar em termos de florestas e não de árvores. Ou pelo menos começar pelas florestas.
"Isso seria como pentear humanos", concluía. Era um macaco irónico.
As árvores tinham os ramos e as folhas embrenhadas uns nos outros como cabelos. Era um macaco dado a associações de ideias. Começava no passado e acabava nos cabelos loiros do presente. As florestas adquiriram os olhos azuis dos cabelos em questão e a vontade de pôr ordem no passado era imediatamente substituída pela de desordenar os ditos cabelos, se possível numa cama.
Da qual cama voltava ao passado, apressado. No cimo das florestas as folhas adquiriam o tom dourado do desejo, a languidez própria do desejo satisfeito.
"Sou por natureza insatisfeito. A satisfação repele-me. Gosto do desejo e do que ele me dá, mas não consigo dar-lhe a lentidão que ele me pede".
Era um macaco estúpido.
"Vistas do espaço as minhas florestas desaparecem".
Voltava, porém, ao desejo como o pára-quedista volta à terra: com uma mistura de alívio e tristeza. "O desejo é uma floresta impenetrável". Gostava de jogos de palavras.
Por vezes voltava atrás e numa dessas vezes apercebeu-se de que.
A distância entre ele e as florestas do seu passado era sempre a mesma. Como se as trouxesse a reboque. Verdade que as florestas cresciam - de cada vez que pensava nelas tinham mais árvores - mas estavam sempre todas elas à mesma distância dele. Não desapareciam.
Ou seja.
Temos um macaco lúbrico, não muito inteligente, lunático, com uma certa apetência para os jogos de palavras e para um par de olhos azuis.
Temos um passado desorganizado, caótico, que não foge às leis da gravidade (são duas: 1- tudo o que sobe tem de descer e 2- desce à mesma velocidade a que subiu. Isto é: chega à terra à mesma velocidade a que a largou) mas anda continuamente a testá-las.
E temos uma certa vontade de os fazer interagir. (Alguns diriam "necessidade" em vez de "vontade").
Há uma palette cromática: as árvores têm cores diferentes, tal como os seios das senhoras são seios e diferentes ou os cabelos ou tudo. "Ou até mesmo os desejos: todos iguais e não há dois iguais", pensou o macaco.
As florestas são habitadas e isso torna ainda mais difícil separá-las, classificá-las e ordená-las. De qualquer forma seria preciso começar por encontrar uma metodologia, uma colecção de critérios: a ter lugar a ordenação seria geográfica, cronológica, temática?
Enquanto isto tudo.
O sol e o vento divertem-se e mudam a cor das folhas. Variação ligeira, ora mais brilhante ora menos, ora mais para o verde e logo azul. Azul. Talvez o macaco devesse começar pelas cores. Seria mais fácil.
Como os livros para crianças.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.