Um raio de sol, um só e Genebra muda. Nesta altura do ano parece que Midas andou a passear por aí, tocando inadvertidamente aqui e ali e com o sol o que era amarelo fica dourado. (Na Primavera gosto do dia em que subitamente as miúdas descobrem que se podem descobrir, mas isso é outra história).
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Muda, mas nem tudo. Há obras em todo o lado. Não me lembro de ter vivido um dia, um que fosse em Genebra sem que houvesse obras num sítio qualquer. Refiro-me a obras importantes, nada de mariquices como re-pavimentar ruas, que se faz aos fins-de-semana e à noite. Agora estão finalmente a fazer o aterro perto da Nautique, um projecto velho de para aí uns vinte anos e que só não avançou antes por causa da oposição do WWF (e provavelmente de outros "ambientalistas", a quem tudo o que cheire a trabalho, dinheiro e melhoramentos cheira mal).
Muito mais divertida é a oposição dos donos de cães do quarteirão onde S. agora vive. É um quarteirão chique, de casas velhas e dinheiro mais velho ainda. Há um terreno vago, inacabado, vazio, feio, cuja única utilidade é servir de urinol aos cães das redondezas. A Câmara quer fazer ali um pavilhão de dança (ou escola de dança? Não sei) mas os proprietários de cães das redondezas opõem-se. S., ela mesma proprietária de uma cadela Leelou, ri-se: "neste bairro há cinquenta advogados por metro quadrado. Não é amanhã que a Câmara vai fazer o pavilhão de dança". Isto de os políticos não terem poder tem vantagens e desvantagens. Para o pavilhão de dança estou-me nas tintas: que os meninos dancem ou os cães mijem não muda grande coisa. Já o aterro da Nautique é importante, é uma obra de que Genève vai beneficiar sem dúvida nenhuma (e a Nautique também, daí a oposição de muitos dos verdes-melancia). Tudo bem pesado, é melhor que eles não possam fazer o que querem: antes a merda escolhida do que o bem imposto.
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(No seguimento de uma troca com F. V. G.) A Suíça é um país paradoxal. Quando se é jovem é impossível apreciá-lo correctamente. Começa por não ser um país: são vinte e seis (tecnicamente, vinte e três cantões e três meios-cantões) que num território mais pequeno do que Portugal têm em comum a moeda e o exército. O resto é diferente, tudo: o sistema escolar, a polícia, a legislação, a carga fiscal, a saúde. Quando aqui cheguei alguns cantões impunham tarifas aos produtos dos outros. Isso acabou, como acabou a proibição de uma polícia entrar no terrítório de outro cantão ou nuns o ano escolar começar em Março e noutros em Setembro (para não mencionar, claro, a abertura da Landsgemeinde às mulheres, mas isso releva mais do folclore do que da política).
É preciso crescer para se perceber a Suíça e sobretudo apreciá-la ao seu justo valor: é o melhor país do mundo, o mais equilibrado, o que deixa mais espaço ao indivíduo, porque é uma espécie de vulcão do qual a superfície é calma e ordenada e o que está por baixo fervilha e só não explode porque se pode manifestar, organizar e votar. Não é por acaso que a Suíça foi o primeiro país do mundo a legalizar a homossexualidade, tema que me interessa tanto como a mija dos cães ou a dança dos meninos, mas é ilustrativo da capacidade inovadora de um sistema que visto de fora parece mais rígido e bloqueado do que uma mulher frígida.
Ao contrário do que muita gente pensa os Suíços não são diferentes de nós. Não é por civismo que os automóveis não passam nos sinais encarnados: é porque estes têm radares e fotografam quem não espera pelo verde. No fundo, "civismo" é simplesmente a capacidade que uma sociedade tem de reconhecer as falhas de quem a constitui e organizar-se em função dessas falhas e não em torno de míticas e inexistentes qualidades como o "civismo", a educação ou respeito pelos outros. Se não respeitas a vida em sociedade és punido (e a punição é pesada e não falha). Se a respeitares fazes o que queres.
Quando se é jovem isto parece opressivo e pesado; quando se cresce percebe-se-lhe a ligeireza. Claro que há contras, mas não há nada que não se possa resolver nas urnas.
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Amanhã volto para o meu P. Não pensei muito nele estes dias. Quem acha que eu só penso em barcos tem aqui um desmentido formal, comprovado (hoje o passeio foi à beira lago para ver os barcos, mas isso é diferente. Sempre foi o meu passeio favorito em Genebra).
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Esta cidade tem mulheres lindas, já aqui o tenho dito muitas vezes. Hoje fui com a minha filha H. à Ferblanterie beber um copo e conversar sobre um breve serviço que terei em Abril e apercebi-me de que não me fica bem mencionar isto: contribuí para isso. Modestamente em quantidade, mas não em qualidade.
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Muda, mas nem tudo. Há obras em todo o lado. Não me lembro de ter vivido um dia, um que fosse em Genebra sem que houvesse obras num sítio qualquer. Refiro-me a obras importantes, nada de mariquices como re-pavimentar ruas, que se faz aos fins-de-semana e à noite. Agora estão finalmente a fazer o aterro perto da Nautique, um projecto velho de para aí uns vinte anos e que só não avançou antes por causa da oposição do WWF (e provavelmente de outros "ambientalistas", a quem tudo o que cheire a trabalho, dinheiro e melhoramentos cheira mal).
Muito mais divertida é a oposição dos donos de cães do quarteirão onde S. agora vive. É um quarteirão chique, de casas velhas e dinheiro mais velho ainda. Há um terreno vago, inacabado, vazio, feio, cuja única utilidade é servir de urinol aos cães das redondezas. A Câmara quer fazer ali um pavilhão de dança (ou escola de dança? Não sei) mas os proprietários de cães das redondezas opõem-se. S., ela mesma proprietária de uma cadela Leelou, ri-se: "neste bairro há cinquenta advogados por metro quadrado. Não é amanhã que a Câmara vai fazer o pavilhão de dança". Isto de os políticos não terem poder tem vantagens e desvantagens. Para o pavilhão de dança estou-me nas tintas: que os meninos dancem ou os cães mijem não muda grande coisa. Já o aterro da Nautique é importante, é uma obra de que Genève vai beneficiar sem dúvida nenhuma (e a Nautique também, daí a oposição de muitos dos verdes-melancia). Tudo bem pesado, é melhor que eles não possam fazer o que querem: antes a merda escolhida do que o bem imposto.
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(No seguimento de uma troca com F. V. G.) A Suíça é um país paradoxal. Quando se é jovem é impossível apreciá-lo correctamente. Começa por não ser um país: são vinte e seis (tecnicamente, vinte e três cantões e três meios-cantões) que num território mais pequeno do que Portugal têm em comum a moeda e o exército. O resto é diferente, tudo: o sistema escolar, a polícia, a legislação, a carga fiscal, a saúde. Quando aqui cheguei alguns cantões impunham tarifas aos produtos dos outros. Isso acabou, como acabou a proibição de uma polícia entrar no terrítório de outro cantão ou nuns o ano escolar começar em Março e noutros em Setembro (para não mencionar, claro, a abertura da Landsgemeinde às mulheres, mas isso releva mais do folclore do que da política).
É preciso crescer para se perceber a Suíça e sobretudo apreciá-la ao seu justo valor: é o melhor país do mundo, o mais equilibrado, o que deixa mais espaço ao indivíduo, porque é uma espécie de vulcão do qual a superfície é calma e ordenada e o que está por baixo fervilha e só não explode porque se pode manifestar, organizar e votar. Não é por acaso que a Suíça foi o primeiro país do mundo a legalizar a homossexualidade, tema que me interessa tanto como a mija dos cães ou a dança dos meninos, mas é ilustrativo da capacidade inovadora de um sistema que visto de fora parece mais rígido e bloqueado do que uma mulher frígida.
Ao contrário do que muita gente pensa os Suíços não são diferentes de nós. Não é por civismo que os automóveis não passam nos sinais encarnados: é porque estes têm radares e fotografam quem não espera pelo verde. No fundo, "civismo" é simplesmente a capacidade que uma sociedade tem de reconhecer as falhas de quem a constitui e organizar-se em função dessas falhas e não em torno de míticas e inexistentes qualidades como o "civismo", a educação ou respeito pelos outros. Se não respeitas a vida em sociedade és punido (e a punição é pesada e não falha). Se a respeitares fazes o que queres.
Quando se é jovem isto parece opressivo e pesado; quando se cresce percebe-se-lhe a ligeireza. Claro que há contras, mas não há nada que não se possa resolver nas urnas.
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Amanhã volto para o meu P. Não pensei muito nele estes dias. Quem acha que eu só penso em barcos tem aqui um desmentido formal, comprovado (hoje o passeio foi à beira lago para ver os barcos, mas isso é diferente. Sempre foi o meu passeio favorito em Genebra).
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Esta cidade tem mulheres lindas, já aqui o tenho dito muitas vezes. Hoje fui com a minha filha H. à Ferblanterie beber um copo e conversar sobre um breve serviço que terei em Abril e apercebi-me de que não me fica bem mencionar isto: contribuí para isso. Modestamente em quantidade, mas não em qualidade.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.