4.3.19

Stakhanovistas da buzina

Nós, ciclistas passamos muito tempo a queixar-nos do comportamento dos automobilistas. Uso a primeira pessoa do plural: faço parte do grupo. Porém, tenho estado a viver numa cidade - Palma de Mallorca - onde as bicicletas são respeitadas, apreciadas e defendidas. Num ano de Palma oiço menos buzinadelas do que em dois dias de Lisboa. Razias tive uma, talvez (mas não estou seguro). As bicicletas são admitidas em quase todas as lojas, apesar de haver parqueamentos a cada esquina. Não menciono os pavimentos, porque dependem das câmaras municipais e não dos carros, claro. Mas posso dizer que há menos buracos em toda a cidade de Palma do que numa rua da nossa cidade.

Acabo de passar um mês em Lisboa e ocorreu-me que somos injustos com os nossos automobilistas. Em primeiro lugar porque eles são selvagens entre eles também, não é só connosco. Apitam-se, insultam-se, cortam-se o caminho uns aos outros como homens de antes da hominização. Depois, porque nos esquecemos de apreciar devidamente o trabalho que ser selvagem dá. É enorme: é preciso estar constantemente à espreita de uma "asneira" (entre aspas porque a maioria das vezes nem isso são), apitar, gritar, exaltar-se por dá cá aquela palha, gesticular, fazer manguitos e por aí fora.

Os nossos automobilistas são verdadeiros stakhanovistas da irritação. Devem ser admirados; e nós não nos devemos queixar de ser o alvo dos seus violentos esforços para não serem absorvidos pela boa educação, pela urbanidade, pela - osemos o termo - civilização.

(Publicado no grupo Massa Crítica).

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