Esta guerra foi longa, ainda não está resolvida e tem aspectos um bocado idiotas. Traz-me à memória outra muito mais longa, a única - ou pelo menos uma das poucas - que lamento vivamente ter ganho.
Passou-se no Burundi e o tema era as tarifas sobre os produtos de ajuda humanitária: tudo o que recebíamos pagava uma taxa de importação, relativamente elevada como sempre em África. Já em tempo normal não sou grande adepto de tarifas; aplicá-las a produtos cuja finalidade era ajudar pessoas que estavam numa situação horrorosa parecia-me o cúmulo do cinismo.
Vai daí, comprei uma guerra. Uma guerra a sério, nada como esta. Um dia tive uma reunião com o director da Alfândega - para quem não sabe: a alfândega em África tem um estatuto quase sagrado, é a única prova tangível que aqueles países têm da sua soberania. O senhor tinha sido Ministro das Finanças, sabia realmente do que falava. Era educadíssimo e falar com ele foi um prazer. Infelizmente não chegámos a um acordo. Ele queria manter as tarifas.
A guerra teve episódios rocambolescos, alguns indescritiveis outros cómicos. Durante a reunião com o dito ex-Ministro das Finanças ouvi uma coisa que me ficou gravada: "Isto não tem nada de animal. Os animais não fazem comércio".
Ganhei-a de uma forma que às vezes me faz corar de vergonha. Estava a perder. Todos, incluindo o representative queriam manter as tarifas; ninguém queria aboli-las. Foram quatro meses de gritos, lutas quase físicas no aeroporto, telefonemas, cartas (no princípio da minha estadia o e-mail era inexistente) . Até que um dia achei que ou perdia ou ganhava e resolvi ganhar. O meu senhorio era a eminência grise do sistema, Controlava tudo, era uma espécie de manipulador-em-chefe do país. Arranjei um jantar com ele - morava numa casa muito perto da minha e por vezes organizámos um churrasco ou um jantar. durante o qual ele tentava extrair-me informações e eu tentava fingir que não percebia.
Organizei o jantar e aproveitei a primeira deixa para lhe dizer que estava desesperado e a pensar seriamente ir-me embora. Podia ele imaginar que os produtos humanitários pagavam direitos de importação? Revoltante! (Sintetizo muito: a conversa foi longa).
Dois ou três dias depois recebíamos uma nota do Ministério das Finanças a isentar os produtos humanitários de taxas alfandegárias. O representative ainda arranjou maneira de manter algumas, mas oitenta por cento das tarifas foram abolidas.
Só alguns meses depois de sair do Burundi percebi que foi uma estupidez: os países precisam daquele dinheiro e se não lhe vier das tarifas virá de outro lado qualquer. É até hoje a minha maior vitória e a que menos sentido faz.
Ensinou-me a avaliar as guerras e as vitórias de outra forma.
Passou-se no Burundi e o tema era as tarifas sobre os produtos de ajuda humanitária: tudo o que recebíamos pagava uma taxa de importação, relativamente elevada como sempre em África. Já em tempo normal não sou grande adepto de tarifas; aplicá-las a produtos cuja finalidade era ajudar pessoas que estavam numa situação horrorosa parecia-me o cúmulo do cinismo.
Vai daí, comprei uma guerra. Uma guerra a sério, nada como esta. Um dia tive uma reunião com o director da Alfândega - para quem não sabe: a alfândega em África tem um estatuto quase sagrado, é a única prova tangível que aqueles países têm da sua soberania. O senhor tinha sido Ministro das Finanças, sabia realmente do que falava. Era educadíssimo e falar com ele foi um prazer. Infelizmente não chegámos a um acordo. Ele queria manter as tarifas.
A guerra teve episódios rocambolescos, alguns indescritiveis outros cómicos. Durante a reunião com o dito ex-Ministro das Finanças ouvi uma coisa que me ficou gravada: "Isto não tem nada de animal. Os animais não fazem comércio".
Ganhei-a de uma forma que às vezes me faz corar de vergonha. Estava a perder. Todos, incluindo o representative queriam manter as tarifas; ninguém queria aboli-las. Foram quatro meses de gritos, lutas quase físicas no aeroporto, telefonemas, cartas (no princípio da minha estadia o e-mail era inexistente) . Até que um dia achei que ou perdia ou ganhava e resolvi ganhar. O meu senhorio era a eminência grise do sistema, Controlava tudo, era uma espécie de manipulador-em-chefe do país. Arranjei um jantar com ele - morava numa casa muito perto da minha e por vezes organizámos um churrasco ou um jantar. durante o qual ele tentava extrair-me informações e eu tentava fingir que não percebia.
Organizei o jantar e aproveitei a primeira deixa para lhe dizer que estava desesperado e a pensar seriamente ir-me embora. Podia ele imaginar que os produtos humanitários pagavam direitos de importação? Revoltante! (Sintetizo muito: a conversa foi longa).
Dois ou três dias depois recebíamos uma nota do Ministério das Finanças a isentar os produtos humanitários de taxas alfandegárias. O representative ainda arranjou maneira de manter algumas, mas oitenta por cento das tarifas foram abolidas.
Só alguns meses depois de sair do Burundi percebi que foi uma estupidez: os países precisam daquele dinheiro e se não lhe vier das tarifas virá de outro lado qualquer. É até hoje a minha maior vitória e a que menos sentido faz.
Ensinou-me a avaliar as guerras e as vitórias de outra forma.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.