6.7.19

A devastadora ausência da lua cheia

Hoje não está lua cheia, nada que se pareça. Saímos há poucos dias da sizígia contrária, a da lua nova, ainda falta muito tempo para que possas invocar a Lua, dizer que é tudo culpa dela, que andas aluada, que as regras te doem, que perdeste peso ganhaste peso ou te dói um dente, que o barulho de um cabelo a cair te acorda em violento sobressalto a meio da noite, as noites de lua cheia no Verão são as piores dizes-me com esse olhar tão trágico tão assustado, esses teus olhos negros como a lua nova, é por causa deles que te assustas quando há luz a mais no céu à noite desconfias de um astro grande e luminoso pelo qual é tão difícil navegar, um astro que come o horizonte.

Não sabes onde apoiar-te, falta-te a lua, pões-me as mãos nesses seios tão redondos, tão duros e dizes-me "está aqui a lua, olha para ela" e eu olho para ela, para elas.

Estás deitada no meio de uma enorme dor de cabeça, vasta como um court de ténis, dizes-me, deitada levantas a blusa para que mãos e olhos as vejam.
- Vês a minha dor de cabeça?
- Não.
- Espera um bocadinho, ela aparece-te já.
- Toma uma aspirina.
- Não quero. É uma dor de cabeça muito bonita, muito lisa e grande. Quero que tu a vejas.

É nessa dor de cabeça que nos perdemos, quando eu acordo já tu te levantaste e saíste dela. Eu não: encosto-me num canto, encolhido como se tivessem acabado de me salvar de morrer afogado e penso na tua lua cheia, que tanta falta te faz.

Não é verdade. Penso nesses teus olhos azuis e nos cabelos loiros e sei que é a mim que a lua cheia ilumina. Uma dor de cabeça avassaladora não substitui a devastação da tua ausência.  

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