"Há muitos anos (quinze?) vi uma exposição em Lagos. Exposição é um manifesto exagero: não foi numa galeria de certeza, mas não me lembro se a miúda expunha na rua se num café. Aposto singelo contra dobrado que foi na rua. Comprei-lhe uma série de quadros, que ainda tenho porque gostei imenso deles, pequenas obras abstractas que exprimiam melhor os dramas da vida dela do que mil palavras. A pintora era magra, loira, bonita e cheirava mal, pior do que um curral de cabras. Não sei como, acabou no meu quarto (eu estava num hotel, a organizar uma regata). Disse-lhe para tomar um banho, ofereci-lhe um jantar e ela pediu-me para "dormir com ela" (aspas porque cito), "mas sem a penetrar" (na proposta inicial, ela dormia no sofá). Já vi pedidos mais estranhos e acedi. Era sérvia ou croata ou daquelas bandas, conhecidas pela beleza das mulheres e pela brutalidade dos discursos. Falava mal inglês, mas de qualquer forma tinha notoriamente pouca vontade de falar e não insisti.
Foi uma das noites de amor (uso o termo propositada e adequadamente) mais terna que já tive. É muito raro isto acontecer, mas quando acordei ela já não estava. Creio, mas talvez imagine, que me deixou uma pequena nota. Não me lembro.
Recentemente revi os quadros, levei-os para Mértola e sonho com o dia em que os possa pôr numa parede.
Hoje - por isso penso nesta história - vim ao bar Rita e vi uma exposição menos abstracta mas com a mesma capacidade de me abalar. O autor é um homem mais velho e mais feio do que eu, chama-se Salvadiego (originalmente confundi com Salvadego, o que me tocou particularmente porque o meu Pai comandou um rebocador salvádego).
Comprei um quadro, dos mais pequenos. Lanento amargamente não ter dinheiro para mais e maiores. Como sempre, pensei imediatamente em o oferecer e perguntei-me a quem. Passei várias pessoas em revista. A busca durou pouco: vou guardá-lo. Ou pelo menos vou tentar guardá-lo. Não é fácil porque gosto de oferecer aquilo de que gosto, mas penso no prazer que tive quando redescobri os quadros da miúda balcânica. Talvez este me dê o mesmo gozo, daqui a uns anos, quando me lembrar desta noite em que me lembrei de ti.
Beijo."
Foi uma das noites de amor (uso o termo propositada e adequadamente) mais terna que já tive. É muito raro isto acontecer, mas quando acordei ela já não estava. Creio, mas talvez imagine, que me deixou uma pequena nota. Não me lembro.
Recentemente revi os quadros, levei-os para Mértola e sonho com o dia em que os possa pôr numa parede.
Hoje - por isso penso nesta história - vim ao bar Rita e vi uma exposição menos abstracta mas com a mesma capacidade de me abalar. O autor é um homem mais velho e mais feio do que eu, chama-se Salvadiego (originalmente confundi com Salvadego, o que me tocou particularmente porque o meu Pai comandou um rebocador salvádego).
Comprei um quadro, dos mais pequenos. Lanento amargamente não ter dinheiro para mais e maiores. Como sempre, pensei imediatamente em o oferecer e perguntei-me a quem. Passei várias pessoas em revista. A busca durou pouco: vou guardá-lo. Ou pelo menos vou tentar guardá-lo. Não é fácil porque gosto de oferecer aquilo de que gosto, mas penso no prazer que tive quando redescobri os quadros da miúda balcânica. Talvez este me dê o mesmo gozo, daqui a uns anos, quando me lembrar desta noite em que me lembrei de ti.
Beijo."
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.