O texto é recente - 26.02.18 - mas pede reedição. Aqui vai.
Se morressem morreriam pobres, os marinheiros. Pobres e podres, que o sal conserva, mas mal: Seca e Meca percorridas o que lhes fica nas entranhas é a liberdade, que da merda livram-se toda e a liberdade corrói, a liberdade é uma prisão da qual só morto escapas e como não morres nem assim de pés para diante dela sairás.
Os marinheiros não morrem: transformam-se em vagas que um dia nas praias desfalecem, montadas por putos em pranchas de surf, a olhar-lhes para as miúdas que os esperam nas areias e a pensar nos albatrozes que viram ao largo do Boa Esperança ou do Horn, nos bordéis onde foram fodidos como putos num ginásio de Atenas, eles que durante um milésimo de segundo pensaram ser os reis do mar, do vento e dos corpos, dos ventres, seres nem vivos nem mortos.
Os marinheiros não morrem: entregam-se um dia em que a pistola do capitão não tenha balas e mais valha folgar do que andar à ròla do mar."
Notas:
"Dou um tiro, etc.": durante a mais célebre das regatas entre clippers (CUTTY SARK vs. THERMOPYLAE) o capitão do Cutty vinha para a ponte, pistola na mão, para impedir os marinheiros de folgar pano.
Retrancas e vergas: peças da mastreação, onde envergam as velas (panos).
Folgar (pano): aumentar o ângulo que uma vela faz com o vento. É a primeira etapa para diminuir o adornar (inclinação) de uma embarcação de vela. A seguinte é rizar (diminuir a área de pano exposta ao vento).
Escotas: cabos que controlam o ângulo que as velas fazem com o vento, uma das afinações fundamentais para a velocidade do navio.
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