9.1.21

Um nome a tudo isso

É mais questão de palavras, de coisas mais facilmente reproduzíveis em sons, letras, símbolos do que em factos sólidos, concretos. Dois seios e um desejo, por exemplo. Desejo vivo, palpável, sentado em mim. Preciso de palavras para ele, para esse desejo que me caiu literalmente no colo. Preciso de palavras para descrever dois desejos que se encaixam um no outro com a implacabilidade da órbita de dois planetas. Preciso de palavras como elas precisam de mim. Ver-te, por exemplo. Falar-te. Ler-te. Sentir-te. Saber-te viva e ver o teu olhar. Parece tão diferente, não parece? Não é. Como esse desejo, como essas palavras que escorrem de um campo, de um mar, de uma pele que se estende pelo mundo, pelo tempo, mão bem espalmada num ventre que a acolhe, grato.

Não falemos desse ventre, nem dessa mão, nem - muito menos - dessa força que os rege. Falemos de nós: planetas de órbitas concêntricas, campos de forças distintas e convergentes, como se uma órbita fosse conjugável com outra.

É. Basta querer, basta pensar para lá dos planos orbitais, das forças centrífugas e centrípetas que ora nos afastam, ora nos aproximam. Há um ponto de equilíbrio no meio desses corpos - são os nossos - dessas mentes - são as nossas. É um ponto longínquo, escondido, disfarçado no meio das silvas astronómicas. Gosto de o imaginar, olhando-nos com as suas antenas verdes. Gosto de imaginar dois corpos perdidos num universo do qual acabaram de descobrir a gravidade. Não sabem ainda se se atraem, mas já sabem da gravidade, essa estranha força que os impele para um ponto.

Trata-se de definir esse ponto. Tarefa fácil: basta definir os corpos, o tempo, o espaço, traçar os contornos físicos do desejo e dar um nome a tudo isso.  

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