- Esta narrativa de culpa e medo está a afectar as pessoas - diz-me R.
- São duas coisas de que elas precisam. Antigamente as igrejas davam-lhas em quantidade. Mataram-lhes Deus, ficam com a Covid - respondo.
Voltámos à Idade Média. Ou pelo menos estamos a caminhar para lá. Magnífica regressão. Cátaros, goliardos, ortodoxos, apóstatas, milenaristas, maniqueístas, estilitas e tutti quanti, o vosso esforço não foi em vão. Deixaram descendentes. Se formos procurar relações entre lojas fechadas e os pecados encontraremos algumas, aposto. Restaurantes, discotecas, lojas de roupa, livrarias (ler não é pecado? Depende do que se lê. Não foi assim há tanto tempo que o Index acabou [1966]) e não tarda está aí outro. Ninguém diz «Se pecares vais para o Inferno», mas «Se pecares não terás direito a ser tratado no hospital». A diferença é pouca. O discurso cristão oscila entre o individualismo - somos únicos e responsáveis perante Deus, é a Ele que devemos obediência e não à tribo - e o «rebanho», termo que aparece a cada três linhas. O pensamento religioso, maniqueísta, está de regresso. Há os bons e os maus, os santos e os pecadores, santa Greta (esta desapareceu? Ou recuou para melhor saltar?) e os «negacionistas», os impuros e os vegans... A lista não acaba. Os crentes sentem-se autorizados a atirar pedras aos outros, aos leprosos da dúvida.
Sabemos o que estamos a perder. Já passámos por lá. Não podemos recuar. Foi a nossa geração que estragou isto, tem o dever de reparar antes de desaparecer.
PS - Não gosto de igrejas, capelas, capelinhas, rebanhos, quintas ou quintinhas. Não é amanhã que me verão fazer parte de uma.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.