Fui ver a exposição da Clara Ramalhão ao
Porto. O título é Só Neste Porto Só. Título bonito e evocador. Gosto muito de
algumas fotografias, pouco de outras, acho algumas coisas dispensáveis – as
legendas das fotografias, por exemplo – mas penso que a exposição deve ser
vista. Isto é: sai-se de lá mais rico do que se entrou. Para começar, os
retratos: são óptimos. Retratam; tem-se a impressão de se conhecer os
retratados ou se não de os querer conhecer. Depois, o tema. Não é original – fotografias
das cidades vazias por esse mundo fora durante os confinamentos contam-se aos
milhares de milhões, suponho – mas demonstra à excelência uma ideia que me
ocorreu durante o primeiro período de clausura: as cidades são feitas de
pessoas, não são feitas de pedras, ruas ou monumentos. São as pessoas que fazem
as cidades, lhes dão vida e história. Um pai e um filho a pedalar de costas
para a objectiva numa rua da Ribeira, à noite, parecem levitar. Efeito feliz da
luz, mas sobretudo efeito feliz do movimento: são as únicas personagens, para
além das pedras da calçada e das paredes das casas. Sem eles, sem aquela luz
que os sustenta, a fotografia não seria muito diferente da de qualquer turista
mai-lo seu telefone portátil. O mesmo se passa com o retrato da senhora a fazer
o sinal da cruz, com o do vagabundo que se esconde: o Porto é eles, são essas
pessoas e as respectivas histórias, que a Clara soube captar.
Uma das coisas que acho interessantes na
exposição é um tema que a priori me arrepia: a fotografia no feminino.
No fim dos anos setenta, princípio dos oitenta conheci na Suíça uma fotógrafa
chamada Simone Oppliger. Foi a primeira vez que senti uma diferença entre a
fotografia feminina e a fotografia masculina: a Simone não usava máquina e
filmes (na altura) para fotografar. Usava sentimentos. Dito assim isto parece
piegas, palerma e banal, eu sei. Mas foi o que me ocorreu quando via as
fotografias que ela fizera de La Chaux-de-Fonds, uma cidade que naqueles anos
não estava deserta mas andava lá muito perto. Com as fotografias da Clara tive
exactamente a mesma sensação. Aposto que se fizesse à Clara as perguntas que
fiz à senhora suíça obteria exactamente a mesma resposta: «não sei».
Eu sei: ide ver a exposição, vede a tristeza
que é uma cidade vazia ou – pior ainda – pessoas a quem roubaram a cidade. O
que não tem relevância pode facilmente ser deixado de lado sem que se note
muito a perda.
Os mosquitos acorrem, o que é sempre bom
sinal. É como ver camiões parados num restaurante de beira da estrada, não é?
Não. Vou sentar-me no interior, pode ser que não me sigam.
Achei muito interessante atualmente esta sua postagens.
ResponderEliminarVida cap resultado Abraços ;) !
Achei muito interessante atualmente esta sua postagens.
ResponderEliminarNúmero do Bruno Berti Abraços ;) !