23.8.21

O Sol e a vida

Bastaria portanto perder-me pelos carreiros por onde a erva cresce e só apareceriam as palavras: os dias são os carreiros, tudo aquilo que vivo e penso as sementes e hey, presto, aparece o texto feito relvado, aparadinho, pronto para um jogo de futebol, um piquenique, uma carícia ou uma leitura solitária. O sol lambe-me a pele, língua rugosa como a de um gato... Não sei. A imagem não é nem boa nem adequada. Gosto mais de Sol do que de gatos, incomparavelmente. Desde sábado trabalho sem camisa, gentileza da clientela e desde sábado não há poro (refiro-me aos pudendos, claro) que não receba o seu minúsculo aguilhão de fotões picantes e ternos.

Na verdade, nem só o Sol me tinge as peles: o mar, a beleza de algumas calas, as manifestações de agrado dos passageiros, a ideia nova e surpreendente de que ainda posso e sei apaixonar-me, coisa que considerava esquecida e enterrada (no cemitério dos Prazeres, naturalmente) também colaboram na tarefa.

A cala Galdana é linda e totalmente desfigurada por um horrível hotel Meliá no seu lado nascente. Apesar disso, resiste. Nem sempre é o caso, mas às vezes a natureza ganha. Quase sempre, na verdade. A natureza ganha e ganha o homem também: os hóspedes do monstro não o vêem, só vêem a beleza que involuntária e indirectamente destruíram.

Eu nem isso vejo. Limito-me a deixar o Sol passear-se-me na pele toda (ou quase); o Sol e a beleza disto tudo. São bons companheiros, o Sol e a vida.

1 comentário:

  1. Caro Luís,

    Descobri recentemente o seu blog e gostava de lhe fazer chegar um livro que estou prestes a publicar.

    Imagino que não seja fácil dar-me uma morada para onde o mandar agora,ou talvez haja alguma cá em Portugal, para quando a época acabar. Seja como for, deixo-lhe aqui o meu email para se me quiser responder: sbc666@gmail.com

    Um abraço,

    Sebastião Belfort Cerqueira

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.