1.9.22

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 01-09-2022

Há vários tipos de melancolia. Hoje vinha a pensar em como qualificá-las, mas acabei reduzido ao ponto de partida: a boa e a má. Aquela sendo a de que se desconhece a causa, a ou as desta sendo conhecidas. Uma melancolia cuja nascente é conhecida sem explorações à la Livingstone não merece esse nome. É má. Só as melancolias que não se sabe de onde vêm têm um mínimo de qualidade e merecem sê-lo. É, portanto, má. Péssima. No limite do suportável. Sei de onde vem, sei o que devia fazer para acabar com ela - que vale uma tristeza de que se almeja o fim? - sei que o farei mal possa: pagar. Trabalhar para acabar com a melancolia? Querem melhor prova de que é da má? A boa não se deixa convencer seja pelo que for.

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Os clientes confirmaram com números o que me diziam com palavras; ou, dito de outra forma, puseram o porta-moedas onde tinham a boca. Cada vez mais acredito em números e menos em palavras, consequência sem dúvida da idade e das experiências. 

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Acabei no Vi Vermell, que se junta definitivamente à lista. O empregado (ou patrão) que no outro dia chorava quando falava de um jogador do Sporting hoje parece-me completamente bêbedo. Os outros, contudo, asseguram. Os secretos estavam óptimos, o vinho é francamente bom apesar de não estar suficientemente frio, o sítio está vazio no interior, pelo que posso escrever à vontade.

Ainda pensei jantar no Glória, que substituiu a gloriosa Quinta Puñeta. Glória coisa nenhuma. Um dia vou lá explicar-lhe como receber clientes solitários e dizer-lhe que volta e meia um gajo sozinho lhe traz cinco ou seis clientes cheios de guito.

Tudo isto precedido por um palos sifonado na Bodega Bellver, onde pela primeira vez fui recebido com um sorriso - pelo filho / empregado, riscar o que não é verdade. O dono continua carrancudo como sempre. Um dia arranquei-lhe um sorriso, mas não me lembro da tecnologia que usei. Pouco importa. O sítio é bom e o resto é conversa de encher chouriços.

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A vida que eu levo não tem rigorosamente nada a ver com aquilo que as pessoas pensam que ela é, excepto num ponto: seria incapaz de viver outra. Mesmo que quisesse e nada está mais longe da minha vontade do que mudar de vida, excepto eventualmente por breves períodos.

Como a residência literária à qual me candidatei, por exemplo. Isso sim, atrai-me. Ser pago para escrever, mesmo que seja num mês o que ganho aqui numa semana.

De qualquer forma, o que ganho aqui entra por um lado e sai pelo outro, intocado. Se entrar menos, sai menos, é tudo.

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Este charter foi-me arranjado por um alemão chamado Thomas (o nome vai por extenso porque é pareceido com o do meu filho). Thomas tem uma qualidade: é um dos poucos alemães joviais que encontrei na vida. Já tinha outro charter engatilhado, mas infelizmente estarei no sul de França, a atravessar para a Córsega. Para o ano é provável que trabalhe o Verão todo para ele. Aposto que a minha melancolia será da boa. A má já estará paga.

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Entrou Setembro, o mês mais terno. O meu mês, o que traz com ele o fim do horrível Agosto.

Agosto é um mês de boçais. Com algumas excepções, das quais os meus clientes são geralmente a prova viva.

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