A última tarde em Dublin foi passada a esperar ardentemente a ida para o aeroporto. Sabendo quanto gosto de aeroportos não deixa de ser inquietante. Mas enfim, ajuda pelo menos a perceber porque é que Beckett, Joyce, Wilde e os outros se puseram a cavar daqui, desta amabilidade lhana, honesta - não é sequer como a genebrina, que se vê à légua ser fingida e superficial - destes prédios todos iguais, duma monotonia esmagadora, excepto em alguns quarteirões mais recentes. Fui ao James Joyce Center, que tem muito de James Joyce e pouco de Center, tentei ir ao Museu da Emigração mas a dezoito euros o bilhete de velhinhos aquilo é para velhinhos ricos, tentei ir ao porto mas era longe, fui a um pub que tem um nome engraçado - chama-se Flowing Tide e ao princípio tomei aquilo por Floating Tide - mas acabei no meu bem amado Celt. Sou de amores rápidos: esta foi a segunda vez que fui ao Celt, mas o raio do lugar tem tudo o que faz de um pub um pub adorável. A começar pela luz, que consoante o sítio onde estamos sentados ora põe tudo a preto e branco ora faz ressaltar algumas manchas de cor aqui e ali, como gotas de um cocktail numa toalha branca - ou cinzenta, neste caso. A comida é decente, os preços dementes - o choque que apanhei a primeira vez em Kinsale já se desvanecera nas vagas da memória, claro - a empregada menos simpática do que a de ontem, mas pronto, lá passei um bom bocado (nos dois sentidos do termo bom). Depois fui dar um passeio pelas ruas pedestres do centro - não se distingue particularmente de outras ruas pedestres, excepto eventualmente para um conhecedor de marcas: a única que vi que conheço foi a Marks and Spencer, mas uma loja é uma loja, chame-se Marx ou Groucho. Há uma livraria pouco atraente, ainda parei em mais um pub horrível chamado Parnell, tresandava a peixe frito e tinha luz como um café de província português.
Oito euros um sumo de laranja e uma barrazita de chocolate. O que eu adoro esperar em aeroportos não tem descrição. Ainda por cima o avião atrasou-se mais de meia-hora. Quando penso que há quem não goste da TAP só me apetece urrar.
Estou no meio de uma tempestade perfeita, com ventos de todos os lados, mar piramidal, voltas de mar a rebentarem-me no convés (atenção, isto não é uma aula de meteorologia do mau tempo), frentes quentes, frias e oclusas, cristas de altas pressões, aguaceiros, nevões. Tudo ao mesmo tempo, tudo de todos os lados. Não admira que a serenidade de Dublin me tenha saltado tanto aos olhos. Que contraste com o meu tumulto interior. Enfim, tumultos, no plural.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.