7.8.23

Diário de Bordos - Barcelona, Catalunha, Espanha, 07-08-2023

Pergunta aos meus leitores juristas: o voo estava narcado para as vinte duas e quarenta. Durante a tarde recebi a mensagem do atraso para as vinte e três. Tarde essa que foi honoravelmente passada a beber copos como o V., um homem sério que me arrastou para esta vida contra toda a minha vontade. Às vinte e uma e trinta estávamos ambos no bar cujo nome não recordo e apercebi-me de que talvez - sublinho talvez - fossem horas de ir para o aeroporto. Saio do dito bar precipitadamente (mas não sem pagar a despesa, há que correr pelas razões justas) e mal cheguei a uma rua com trânsito apanhei um táxi. Dentro do qual fico a saber que afinal o voo sai às vinte e três e cinquenta. As consequências são: a) uma viagem de táxi em vez de autocarro; b) um jantar no aeroporto em vez de na cidade; c) uma espera de uma hora no aeroporto. A minha pergunta é: quem tem de pagar estes inconvenientes todos: a) eu; b) a companhia aérea; c) o tanas?

Voto pelo tanas, que é a vítima habitual deste tipo de incidentes. Infelizmente o tanas sou eu, no linguarejar das companhias aéreas.

Não é despiciendo notar que as minhas decisões foram tomadas com fundamento na informação que eu tinha no momento. Ou seja: começo a acreditar que não se devem tomar decisões com informação atempada, mas sim com informação a posteriori. Deve jogar-se ao totobola às segundas-feiras e não às sextas.

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Uma questão que me tem atarabustado ultimamente é a da influência da filha da putice no dispositivo de fixação de preços. Para um liberal, os preços fixam-se em função da procura e da oferta. Não há considerações morais no mecanismo. Porém, há quem pense que aproveitar-se da miséria alheia é eticamente censurável. Dou como exemplo os ingleses, que durante muito tempo não tinham rebocadores de alto mar (não sei se ainda é o caso) porque achavam errado aproveitar-se financeiramente da desgraça de um navio em dificuldades. Isso não os impedia de ter rebocadores estrangeiros em standby nos pontos estratégicos (o CINTRA, do qual o meu Pai foi imediato e mais tarde capitão é um exemplo). Havia uma razão para isso: a boa-vontade não chega para pagar a assistência a quem dela precisa. Financeira, económica e humanamente mais vale pagar a um rebocador do que não ter rebocador. Ou seja: no mecanismo da fixação de preços a ética não tem lugar à mesa. 

Um outro elemento a ter em conta nesta equação é um axioma simples: cada um deve defender os seus interesses e não os dos outros. Isto é: cada um é responsável por aquilo que é melhor para si e não por aquilo que é melhor para outrém. Se os rebocadores do meu exemplo supra pensarem no navio em dificuldade e não na sua tripulação e nos custos de manter o navio em menos de três não haveria rebocadores.

Contudo, neste mecanismo de fixação de preços há um parâmetro que permite a inclusão de factores subjectivos. A amizade, por exemplo. A empatia: se um amigo estiver numa aflição e eu o puder ajudar ajudo-o, independentemente da lei da oferta e da procura. Não vou cobrar a um refugiado o trabalho que tive a salvá-lo. 

Entre estes dois extremos - de um lado a lei da oferta e da procura, do outro a humanidade - há espaço para mover o cursor, como quando tentamos encontrar a iluminação certa com um dimmer. A grande dificuldade é saber onde colocar esse cursor. Em que ponto da linha, digamos. Todos e cada um de nós pensam ser único e merecedor da empatia alheia. Já os fornecedores da empatia não vêem o mesmo.

Por isso, devemos eliminar a filha da putice da equação. A diferença reside simplesmente numa situação diversa das perspectivas; ou, para rimar, das expectativas.

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O BP está a caminho de Portugal. Não se pode dizer que isto seja o fim dos meus anxiogénos. É simplesmente um passo em frente. Na esperança que em frente não esteja um abismo.

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Embarque no avião da TAP. Uma hora e dez minutos de atraso, o que não é raro em qualquer companhia a esta hora.

Em contrapartida: cadeiras em dois mais dois e não três três, como é habitual (o avião é um Embraer e não um Airbus). Digam mal da TAP digam. Eu usufruo.

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